Estou na Internet desde 2001, Trabalho com Informatica (Tecnico a mais de 12 anos)Adoro Leitura, Público Artigos Bíblicos para (SpoesS.GospeL)Gosto de compartilhar Conhecimento junto ao Leitor
Mas Deus permite, algumas
vezes, que a malvadez leve o homem muito longe em perseguir os cristãos, a fim
de ficar manifestado o que está no seu coração, e por isso não é de estranhar
que na alma do cristão que não tem apreciado esta verdade se levantem dúvidas e
dificuldades, e que comece a queixar-se de o caminho ser custoso, e da mão do
opressor ser pesada sobre ele. 8
O Senhor porém não nos deixa na
Terra para nós nos queixarmos das dificuldades, nem para recuarmos diante da
ira dos homens: temos de servir ao Mestre e resistir ao inimigo, porém é
somente quando estamos fortalecidos no Senhor e na força do seu poder que
podemos prestar esse serviço, ou resistir efetivamente a esse inimigo.
Esta história pretende indicar
quão dignamente se fez isto nos tempos passados, porém se quisermos compreender
a maneira como Deus tem tratado o seu povo, sempre nos devemos lembrar de que a
milícia cristã é diferente de qualquer outra, e que uma parte da sua
resistência é o sofrer.
As armas da nossa milícia não
são carnais, mas sim espirituais, e o cristão que se serve de armas carnais
mostra sem dúvida que não aprecia o caráter do verdadeiro crente. Não pode ter
apreciado com inteligência espiritual o caminho do seu Senhor, ou compreendido
o sentido das suas palavras: "O meu reino não é deste mundo; se o meu
reino fosse deste mundo pelejariam os meus servos".
A igreja militante é uma igreja
que sofre, mas se empregar as armas carnais, deixa na verdade de combater.
No ousado e santo Estêvão temos
um exemplo do verdadeiro crente militante. Foi ele o primeiro mártir cristão.
E que grande vitória ele ganhou para a causa de Cristo quando morreu pedindo ao
Senhor pelos seus perseguidores! Davi, séculos antes da era cristã, disse: "O
justo se alegrará quando vir a vingança : lavará os seus pés no sangue do
ímpio", porém Estêvão, que viveu na época cristã, orou:"Senhor,
não lhes imputes este pecado". Isto foi um exemplo da verdadeira
milícia cristã.
A primeira onda da perseguição
geral que veio sobre a igreja fez-se sentir no ano 64, no reinado do imperador
Ne-ro, que tinha governado já com uma certa tolerância durante nove anos.
Neste tempo, o assassinato de
sua mãe, e a sua indiferença brutal depois de ter praticado aquele crime tão
monstruoso, mostrou claramente a sua natural disposição, e indicou ao povo
aquilo que havia de esperar dele. Desgraçadamente, as tristes apreensões que
muitos tinham a seu respeito tornaram-se em negra realidade.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
Porém estava para chegar um
tempo de perseguição para a Igreja, e isso foi permitido pelo Senhor, na sua
graça, a fim de que se pudessem distinguir os fiéis.
Esta perseguição, instigada
pelo imperador romano Nero, foi a primeira das dez perseguições gerais que
continuaram, quase sem interrupção, durante três séculos.
"Por que razão permite
Deus que o seu povo amado sofra assim?"Muitas vezes se tem feito esta
pergunta, e a resposta é simples: é porque Ele ama esse povo. Podia haver, e
sem dúvida há, outras razões, porém a principal é esta - Ele o ama. "Porque
o Senhor corrige o que ama ' e se o coração se desviar, tornar-se-á
necessária a disciplina.
Com que facilidade o mal se
liga, mesmo ao melhor dos homens! Mas, na fornalha da aflição, a escória
separa-se do metal precioso, sendo aquela consumida. Ainda mais, quando
suportamos a correção de Deus, Ele nos trata como filhos; e se sofremos com
paciência, cada provocação pela qual Ele nos faz passar dará em resultado mais
uma bênção para a nossa alma. Tal experiência não nos é agradável, nem seria
uma provocação se o fosse, porém, à noite de tristeza sucede a manhã de
alegria, e dizemos com o salmista Davi: "Foi bom para mim, ter sofrido
aflição".
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
A história da Igreja de Deus
tem sido sempre, desde a era apostólica até o presente, a história da graça
divina no meio dos erros dos homens. Muitas vezes se tem dito isso, e qualquer
pessoa que examine essa história com atenção não pode deixar de se convencer
que assim é.
Lendo as Epístolas do Novo
Testamento vemos que mesmo nos tempos apostólicos o erro se manifestou, e que a
inimizade, as contendas, as iras, as brigas e as discórdias, com outros males,
tinham apagado o amor no coração de muitos crentes verdadeiros.
Deixaram as suas primeiras
obras e o seu primeiro amor e alguns que tinham principiado pelo espírito, procuravam
depois ser aperfeiçoados pela carne.
Mas havia muito mais do que
isso. Não somente existiam alguns verdadeiros crentes em cujas vidas se viam
muitas irregularidades, e que procuravam, pelas suas palavras, atrair
discípulos a si, como também havia outros que não eram de modo algum cristãos,
mas que entraramdespercebidamente entre os
irmãos, semeando ali a discórdia. Isto descreve o estado de coisas a que se
referem os primeiros versículos do capítulo dois de Apocalipse, na carta
escrita ao anjo da igreja em Éfeso.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
MORTE DE NABUCODONOSOR, REI DA BABILÔNIA. EVIL-MERODAQUE,
SEU
FILHO, SUCEDE-O E PÕE JECONIAS, REI DEJUDÁ, EM LIBERDADE.
SÉRIE DOS
REIS DA BABILÔNIA ATÉ BELSAZAR. CIRO, REI DA PÉRSIA, E
DARIO, REI DOS
MEDOS, CERCAM-NO NA BABILÔNIA. VISÃO QUE ELE TEM, EXPLICADA
POR
DANIEL. CIRO TOMA A BABILÔNIA E APRISIONA O REI BELSAZAR.
DARIO
LEVA DANIEL PARA A MÉDIA E O ELEVA A GRANDES HONRAS. A
INVEJA DOS
NOBRES CONTRA ELE É CAUSA DE ELE SER LANÇADO NA COVA DOS
LEÕES.
DEUS O SALVA, E ELE TORNA-SE MAIS PODEROSO DO QUE NUNCA.
SUAS PROFECIAS E SEU LOUVOR.
433. Depois da morte
do rei Nabucodonosor, de que acabamos de falar, Evil-Merodaque, seu filho,
sucedeu-o e não somente pôs Jeconias (que antes se chamava Joaquim), rei de
Judá, em liberdade, como também deu-lhe ricos presentes, tornou-o mordomo-mor
de seu palácio e dedicou a ele um afeto muito particular. E assim, tratou-o de
uma maneira bem diferente da que Nabucodonosor o havia tratado, quando o amor
pelo bem de seu país, como vimos, o fez entregar-se em boa fé nas mãos deste,
com sua mulher, seus filhos e todos os seus bens, para que fosse levantado o
cerco de Jerusalém, sendo que Nabucodonosor lhe faltou à palavra.
Evil-Merodaque reinou dezoito anos. Niglizar, seu filho,
sucedeu-o e reinou quarenta anos. Seu filho Labofordá, que o sucedeu, reinou
somente nove meses. Belsazar, filho deste, a quem os babilônios chamam
Naboandel, substituiu-o. Ciro, rei dos persas, e Dario, rei dos medos,
fizeram-lhe guerra e o sitiaram na Babilônia.
434. Daniel 5.
Enquanto a cidade era cercada, esse soberano oferecia um banquete aos nobres da
corte e às suas concubinas numa sala onde havia um armário riquíssimo, em que
se conservavam os preciosos vasos de que os reis se costumam servir. A isso ele
quis acrescentar uma nova magnificência e ordenou então que fossem trazidos os
vasos sagrados do templo de Jerusalém, os quais Nabucodonosor mandara colocar
junto com os de seus deuses, porque não se atrevera a servir-se deles. Como
Belsazar estava turvado pelo vinho, teve a ousadia de beber num daqueles vasos
e de blasfemar contra Deus. No mesmo instante, ele viu uma mão sair da parede e
escrever nela algumas palavras.
A visão deixou-o atônito, e ele mandou buscar da Caldéia e
de outras nações alguns dos maiores sábios que sabiam interpretar os sonhos e
ordenou-lhes que dissessem o significado daquelas palavras. Eles responderam
que era impossível. O seu sofrimento aumentou de tal modo que ele mandou
apregoar que daria uma cadeia de ouro, uma túnica de púrpura, como as que usam
os reis da Caldéia, e a terça parte do reino a quem interpretasse aquelas
palavras.
A promessa de tão grande recompensa fez chegar de todos os
lados candidatos que passavam pelos mais hábeis e peritos. Todavia, por maiores
esforços que todos fizessem, ninguém foi capaz de interpretá-las. A princesa
sua avó, vendo-o em tal aflição, disse-lhe para não perder a esperança de que
alguém lhe desse a explicação que desejava, porque havia entre os escravos que
Nabucodonosor trouxera para a Babilônia depois da ruína de Jerusalém um certo
Daniel, cuja ciência era extraordinária. Ele explicava coisas que somente eram
conhecidas por Deus e interpretara um sonho que nenhum outro conseguira
explicar. Precisava apenas mandar chamá-lo e dizer-lhe do seu desejo de saber o
significado daquelas palavras, pois talvez até fosse algo inquietante que Deus
quisesse comunicar.
Diante de tal conselho, Belsazar mandou imediatamente chamar
Daniel, disse-lhe o quanto se sentia feliz por saber que ele recebera de Deus o
dom de penetrar e conhecer o que os outros ignoravam e rogou que lhe dissesse o
que significavam as palavras escritas naquela parede, prometendo-lhe, se o
fizesse, dar-lhe uma túnica de púrpura, uma cadeia de ouro e a terça parte de
seu reino, para mostrar a todos, com aquelas demonstrações de honra, a sua
sabedoria, quando fosse conhecida a causa de ele merecê-las. Daniel, ciente de
que a sabedoria que vem de Deus deve sempre ter em vista fazer o bem sem
pretender outra recompensa, suplicou ao rei que o dispensasse de aceitá-las.
Disse-lhe em seguida que aquelas palavras significavam que o
fim da vida de Belsazar estava próximo, porque ele não havia aprendido com o
castigo com o qual Deus punira a impiedade de Nabucodonosor e nem aproveitara
aquele exemplo para evitar colocar-se acima da sua condição de simples homem,
pois não podia ignorar que aquele príncipe fora obrigado a viver durante sete
anos à maneira dos animais e que só depois de muitas preces Deus, movido pela
compaixão, o reconduziu ao convívio dos homens e o restabeleceu no trono. E
Nabucodonosor foi tão grato que pelo resto de sua vida não deixou de dar a Deus
contínuas ações de graças e de admirar o seu poder onipotente. No entanto
Belsazar, em vez de se deixar levar por aquele exemplo, não tivera medo de
blasfemar contra Deus e de beber com as suas concubinas nos vasos consagrados
em honra dEle. Por isso Ele estava tão irritado que desejou manifestar por meio
daquelas palavras qual seria o fim de sua vida.
Daniel acrescentou ainda que esta era a explicação das
palavras: Mene, isto é, "número", significava que o número que Deus
marcara aos anos do reinado de Belsazar iria se completar, e lhe restava muito
pouco tempo de vida. Tequel, isto é, "peso", significava que Deus
havia pesado na sua justa balança a duração daquele reinado, e que ele tendia
ao fim. Peres, que quer dizer "fragmento" e "divisão",
significava que o reino seria dividido entre os medos e os persas. Por maior
que fosse a dor que sentia, o rei Belsazar, sabendo pela explicação dessas
palavras misteriosas as desgraças que o aguardavam, julgou que Daniel agira
como um homem de bem e lhe dissera somente a verdade, e seria muito injusto
maltratá-lo por essa razão. Por isso não deixou de o recompensar, dando-lhe o
que prometera.
435. Naquela mesma noite, Babilônia foi tomada e Belsazar,
morto. Isso aconteceu no dédicmo sétimo ano do reinado de Ciro, rei da Pérsia.
Dario, filho de Astíages, ao qual os gregos dão outro nome, tinha sessenta e
dois anos quando, com o auxílio de Ciro, seu parente, destruiu o império da
Babilônia. Levou consigo para a Média o profeta Daniel e, para mostrar até que
ponto o estimava, nomeou-o um dos três governadores supremos, cujo poder se
estendia sobre outros trezentos e sessenta, pois o considerava um homem todo
divino e só se aconselhava com ele nos assuntos mais importantes.
Os outros ministros, como geralmente acontece na corte dos
reis, não podendo tolerar que ele fosse tão preferido, sentiram tal inveja que
tudo fizeram para encontrar um motivo de caluniá-lo. Mas isso lhes foi
impossível, porque a virtude de Daniel era tão grande e as suas mãos tão puras
que ele julgava que seriam manchadas se recebessem presentes e considerava
coisa vergonhosa desejar recompensa pelo bem que se faz. Eles, porém, não se
arrependeram nem desistiram. E, faltando-lhes outros meios, imaginaram um pelo
qual, pensaram, poderiam destruí-lo.
Tendo notado que três vezes por dia ele fazia as suas
orações a Deus, foram ter com o rei e disseram-lhe que todos os grandes e
governadores do império haviam julgado conveniente elaborar um edito pelo qual
seria proibido a todos os súditos, durante trinta dias, fazer orações a
qualquer deus ou a qualquer homem, senão a ele, o rei, devendo ser lançados na
cova dos leões todos os que desprezassem essa ordem. Dario, que não desconfiava
de sua malícia, aceitou a proposta e mandou publicar esse edito em todo o seu
território. Todos o obser-varam, exceto Daniel, que sem se impressionar
continuou a fazer as suas orações a Deus, como era seu costume.
Os seus inimigos não deixaram de ir imediatamente ao rei
acusá-lo de ter violado a ordem. Afirmaram que ele fora o único a ousar
desobedecer, e era tanto mais culpado porque não o fizera por um sentimento de
piedade apenas, mas por saber que aqueles que não o estimavam observavam as
suas ações. E, como esses nobres temiam que a grande afeição de Dario por
Daniel o levasse a perdoá-lo, insistiram tanto em que fosse inflexível em fazer
observar o seu edito e ordenasse que Daniel fosse atirado na cova dos leões que
não lhe foi possível defender-se. Mas ele esperava que Deus libertasse Daniel
do furor daqueles temíveis animais e exortou-o a suportar generosamente a sua
desdita. E assim, foi Daniel atirado àquele lugar, e fecharam a porta com uma
grande pedra. Dario mandou selá-la com o seu sinete e voltou para o palácio
imerso em tão grande aflição pelo que poderia acontecer a Daniel que não quis
comer e passou toda a noite sem dormir.
No dia seguinte, ao despontar do sol, o rei foi à cova dos
leões e viu que o seu selo estava intacto. Chamou Daniel por uma abertura que
havia na entrada e perguntou, gritando com todas as suas forças, se ele ainda
estava vivo. Daniel respondeu que não sofrerá mal algum, e o soberano no mesmo
instante mandou que o retirassem de lá. Os inimigos de Daniel, em vez de
reconhecerem que Deus o salvara por um milagre, disseram ousadamente ao rei que
aquilo acontecera porque antes se dera demasiado alimento aos leões, os quais,
não tendo mais fome, não o quiseram devorar. O rei ofendeu-se com a malícia
deles e ordenou que se desse grande quantidade de carne aos leões e que depois
de eles estarem fartos fossem atirados à cova os acusadores de Daniel, para ver
se os animais os poupariam, como diziam haverem poupado Daniel. A ordem foi
imediatamente executada, e ninguém mais pôde duvidar de que Deus salvara
Daniel, porque os leões devoraram os caluniadores com tanta avidez que pareciam
os mais esfomeados do mundo. Minha opinião, porém, é que foi o crime desses
malvados, e não a fome, o que irritou os leões contra eles, porque Deus quis
que esses animais irracionais fossem ministros de sua justiça e de sua
vingança.
Depois que os inimigos de Daniel foram assim punidos, Dario
mandou publicar em todo o seu território que o Deus que Daniel adorava era o
único verdadeiro e Todo-poderoso e elevou esse grande personagem a tão alto
grau de honras que ninguém duvidava que ele fosse o homem mais estimado pelo
rei em todo o império, e todos admiravam tão grande glória e tão extraordinário
favorecimento da parte de Deus.
Dario mandou construir em Ecbátana,* capital da Média, um
soberbo palácio, que ainda hoje se vê e que parece ter sido recém-concluído,
pois conserva o seu primitivo brilho, ao contrário do comum dos edifícios, aos
quais o tempo apaga a beleza, envelhecendo-os como aos homens. É nesse palácio
que está a sepultura dos reis dos medos, dos persas e dos partos. A sua guarda
ainda hoje está confiada a um sacerdote de nossa nação.
Nada encontro de mais admirável nesse grande profeta que
esta felicidade particular e quase incrível de que desfrutou, acima dos demais:
ter sido durante toda a sua vida honrado pelos reis e pelos povos e deixar
depois de sua morte uma memória imortal. Os livros que ele escreveu, lidos
ainda hoje, comprovam que Deus mesmo lhe falou e que ele não somente predisse
em geral, como os outros profetas, as coisas que deviam acontecer, mas também
determinou o tempo em que sucederiam. E, enquanto eles prediziam somente
desgraças, o que os tornava odiosos aos soberanos e aos súditos, ele predisse
coisas favoráveis, que levaram os reis a amá-lo. E a veracidade de suas
palavras, confirmada depois pelos fatos, fez com que todos não somente
prestassem fé às suas pala-vras, mas cressem que havia nele algo de divino.
Narrarei uma de suas profecias, para mostrar como eram
corretas. Ele disse que, tendo saído com os seus companheiros da cidade de
Susã, que é a capital do reino da Pérsia, para tomar ar no campo, houve um
tremor de terra, que surpreendeu e espantou de tal modo os que estavam com ele
que todos fugiram e o deixaram sozinho. Ele lançou-se então com o rosto em
terra e, estando assim nesse estado, percebeu que alguém o tocava e lhe dizia
para levantar, a fim de ver as coisas que sucederiam muito tempo depois aos de
sua nação.
Depois que ele se ergueu, viu um carneiro que tinha vários
chifres, sendo o último maior que os outros. Voltando os olhos para o lado do
ocidente, viu aproximar-se um bode, que se chocou com o carneiro, derrubou-o e
o pisou. Viu depois sair da fronte desse bode um chifre bem grande, que foi
quebrado, e dele saíram outros quatro, voltados para os quatro ventos. Entre
esses quatro chifres, surgiu um menor. Deus lhe disse que esse chifre, quando
crescesse, faria guerra à sua nação, tomaria Jerusalém, aboliria todas as
cerimônias do Templo e durante mil e duzentos e noventa e seis dias proibiria
que ali se oferecessem sacrifícios.
Depois que Deus lhe manifestou essa visão, explicou-a deste
modo: o carneiro significava o império dos medos e dos persas, cujos reis eram
representados pelos chifres. O maior era o último deles, porque sobrepujava a
todos em riquezas e em poder. O bode significava que viria da Grécia um rei que
venceria os persas e se tornaria senhor daquele grande império — o chifre
grande significava esse rei. Os quatro chifres pequenos nascidos desse grande
chifre e que se dirigiam para as quatro partes do mundo representavam aqueles
que depois da morte desse soberano dividiriam entre si esse grande império,
embora não fossem nem seus filhos nem seus descendentes. Eles reinariam durante
vários anos, e de sua posteridade viria um rei que faria guerra aos judeus,
aboliria todas as suas leis e toda a forma de sua república, saquearia o Templo
e durante três anos proibiria que ali se oferecessem sacrifícios. Isso tudo
aconteceu sob o reinado de Antíoco Epifânio.
Esse grande profeta deu também notícia do império de Roma e
da extrema desolação a que reduziria o nosso país. Deus lhe tornou patentes
todas essas coisas, e ele as deixou por escrito para serem admiradas pelos que
lhe vissem os efeitos, para mostrar os favores que recebera dEle e para
confundir os erros dos epicureus, que, em vez de adorarem a Providência, dizem
que Ele não se importa com os interesses deste mundo e que a terra não é
conservada nem governada por essa suprema Essência, igualmente bem-aventurada,
incorruptível e onipotente, mas subsiste por si mesma. Se eles considerassem
verdade o que dizem, ver-se-iam logo perecendo como um navio que, não tendo
piloto, é batido pela tempestade ou como um carro sem condutor, que é arrastado
pelos cavalos. Não pode haver melhor prova que as profecias de Daniel para nos
fazer constatar a loucura de quem não aceita que Deus tenha cuidado com o que
se passa sobre a terra. Pois se tudo o que acontece no mundo é por acaso, como
explicar o cumprimento de todas essas profecias? Julguei meu dever relatar tudo
isso conforme o que encontrei nos Livros Santos, mas deixo a cada qual
liberdade para ter outras opiniões ou acreditar no que quiser.
__________________
* Ou Acmetá.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
O EXÉRCITO DE NABUCODONOSOR TOMA JERUSALÉM, SAQUEIA O TEMPLO
E
O QUEIMA, BEM COMO AO PALÁCIO REAL, DESTRUINDO COMPLETAMENTE
A
CIDADE. NABUCODONOSOR MANDA MATAR SERAÍAS, SUMO SACERDOTE, E
VÁRIOS OUTROS. FAZ VAZAR OS OLHOS DE ZEDEQUIAS E LEVA-O
ESCRAVO À
BABILÔNIA, BEM COMO UM GRANDE NÚMERO DE JUDEUS. ZEDEQUIAS
MORRE. NOMES DOS SUMOS SACERDOTES. GEDALIAS É CONSTITUÍDO
POR
NABUCODONOSOR CHEFE DOS HEBREUS ESTABELECIDOS NA JUDÉIA.
ISMAEL
MATA-O E LEVA OS PRISIONEIROS. JOÃO E SEUS AMIGOS
PERSEGUEM-NO E
OS LIVRAM. RETIRAM-SE PARA O EGITO CONTRA O CONSELHO E A
OPINIÃO DE
JEREMIAS. NABUCODONOSOR, APÓS VENCER O REI DO EGITO, LEVA OS
ESCRAVOS PARA A BABILÔNIA. FAZ EDUCAR COM MUITO CUIDADO AS
CRIANÇAS JUDIAS QUE ERAM DA NOBREZA. DANIEL E TRÊS DE SEUS
COMPANHEIROS, TODOS PARENTES DO REI ZEDEQUIAS, ESTÃO ENTRE
ELES.
DANIEL, ENTÃO CHAMADO BELTESSAZAR, EXPLICA A NABUCODONOSOR
UM
SONHO. O REI DIGNIFICA DANIEL E SEUS COMPANHEIROS COM OS
MAIS
ALTOS CARGOS DO IMPÉRIO. OS TRÊS COMPANHEIROS DE DANIEL,
SADRAQUE. MESAQUE E ABEDE-NEGO, RECUSAM-SE A ADORAR A ESTÁTUA QUE NABUCODONOSOR
MANDOU FAZER. SÃO ATIRADOS A UMA FORNALHA ARDENTE, E DEUS OS SALVA.
NABUCODONOSOR, DEPOIS DE OUTRO SONHO,
QUE DANIEL TAMBÉM IBE EXPLICA, PASSA SETE ANOS NO DESERTO
COM OS
ANIMAIS. VOLTA AO SEU ESTADO PRIMITIVO. SUA MORTE. TRABALHOS
SOBERBOS POR ELE EXECUTADOS EM BABILÔNIA.
425. Nabucodonosor apertava cada vez mais o cerco. Mandou
construir altas torres, com as quais sobrepassava as muralhas da cidade, e
também grande quantidade de plataformas tão altas quanto os muros. Os
habitantes, por sua vez, defendiam-se com todo o empenho e com toda a coragem
possível, sem que a fome e a peste pudessem esmorecê-los. A coragem dava-lhes
ânimo contra todos os males e perigos. E, sem se espantar com as máquinas de que
seus inimigos se serviam, opunham-lhes outras. Assim, não era somente à força
aberta, mas também com muita arte que a guerra transcorria entre essas duas
valentes nações. Era principalmente por esse último meio que alguns esperavam
conquistar a praça, e outros, ao invés, conservá-la.
Passaram-se dezoito meses desse modo. Por fim, os sitiados,
consumidos pela fome, pela peste e pela quantidade de dardos que os inimigos
lhes atiravam do alto das torres, cederam, e a cidade foi tomada pela
meia-noite do décimo primeiro ano, no nono dia do quarto mês do reinado de
Zedequias, por Nergelear, Aremante, Emegar, Nabazar e Ercarampsar, generais de
Nabucodonosor que então estavam em Ribla. Eles marcharam diretamente para o
Templo. O rei Zedequias, sua esposa, seus filhos, seus parentes e as pessoas da
nobreza que ele mais estimava saíram da cidade para fugir por lugares
desconhecidos rumo ao deserto.
Os babilônios, porém, foram avisados por um dos que eles
haviam deixado de lado ao fugir, e ao despontar do dia puseram-se a
persegui-los. Alcançaram-nos perto de Jerico e quase todos os que acompanhavam
Zedequias o abandonaram. Ele foi aprisionado com sua mulher, seus filhos e os
poucos que lhe restavam, e todos foram levados ao rei. Nabucodonosor chamou-o
de ímpio e pérfido por faltar à promessa de lhe conservar inviolavelmente o
reino, pois para isso pusera a coroa na sua cabeça. Reprovou-lhe a ingratidão,
por esquecer-se da obrigação que lhe devia por tê-lo preferido a Joaquim, seu
sobrinho, ao qual pertencia o reino, e por ter empregado contra o seu benfeitor
o poder que este lhe concedera. E terminou com estas palavras: "Mas o
grande Deus, para castigar-vos, vos entregou em minhas mãos". Então, na
presença dele e diante dos outros escravos, mandou matar os seus filhos e
amigos. Vazou-lhe os olhos e ordenou que o acorrentassem para levá-lo escravo à
Babilônia.
Assim, cumpriram-se ambas as profecias, a de Jeremias e a de
Ezequiel, que esse desventurado príncipe tão erradamente desprezara: a de
Jeremias, que afirmava que ele seria feito prisioneiro, seria levado a
Nabucodonosor, falaria com ele e o veria face a face; a de Ezequiel, que dizia
que ele seria levado à Babilônia, mas não a poderia ver. Esse exemplo ensina,
mesmo aos mais ignorantes, o poder e a sabedoria infinita de Deus, que sabe
fazer realizar por diversos meios e no tempo por Ele marcado tudo o que
determina e prediz. Esse mesmo exemplo faz também ver a ignorância e
incredulidade dos homens: a primeira os impede de prever o que lhes sucederá; a
segunda faz com que eles caiam, quando menos esperam, na infelicidade e na
desgraça de que foram ameaçados e só as conheçam quando as sentirem e quando
não mais estiver em seu poder evitá-las.
Esse foi o fim da estirpe de Davi, depois que vinte e um
reis seus descendentes sucessivamente ocuparam o trono e empunharam o cetro do
reino de Judá. E todos os seus governos, juntamente, duraram quinhentos e
quatorze anos, seis meses e dez dias.
Nabucodonosor, depois da vitória, enviou Nebuzaradã, general
de seu exército, a Jerusalém, com ordem de incendiar o Templo após retirar de
lá tudo o que encontrasse e de também reduzir a cinzas o palácio real e de
destruir a cidade por completo. Deveria trazer depois todos os habitantes como
escravos para a Babilônia. Assim, no décimo oitavo ano do reinado desse
príncipe, que era o décimo primeiro do reinado de Zedequias, no primeiro dia do
quinto mês, esse general, para executar tal ordem, despojou o Templo de tudo o
que lá encontrou: levou todos os vasos de ouro e de prata, o grande vaso de
cobre chamado mar, que Salomão mandara fazer, as duas colunas de bronze, as
mesas e os candelabros de ouro. Em seguida, incendiou o Templo e o palácio real
e destruiu completamente a cidade. Isso aconteceu quatrocentos e setenta anos,
seis meses e dez dias desde a construção do Templo, mil seiscentos e dois anos,
seis meses e dez dias desde a saída do Egito e mil novecentos e cinqüenta anos,
seis meses e dez dias desde o dilúvio.
Nebuzaradã ordenou então que se levasse o povo como escravo
para a Babilônia, até mesmo o rei, que então estava em Ribla, cidade da Síria,
e também Seraías, sumo sacerdote, Cefã,* que era o segundo dos sacerdotes, os
três oficiais a quem estava confiada a guarda do Templo, o primeiro dos
eunucos, sete dos que desfrutavam maior favor perante Zedequias, o secretário
de Estado e sessenta outras pessoas de classe, que ele apresentou ao príncipe
com os despojos do Templo. Nabucodonosor, naquele mesmo lugar, mandou cortar a
cabeça ao sumo sacerdote e aos mais nobres. Em seguida mandou levar para a
Babilônia o rei Zedequias, Jeozadaque, filho de Seraías, e todos os outros
escravos.
Depois de haver registrado a série dos reis que empunharam o
cetro do povo de Deus, julgo dever referir também a dos sumos sacerdotes que se
sucederam desde que Salomão construiu o Templo. O primeiro foi Zadoque, cujos
descendentes foram: Aquimas, Azarias, Jorão, His, Aciorão, Fideas, Sudeas, Jul,
Jotão, Urias, Nerias, Odeas, Saldum, Elcias, Seraías e jeozadaque, que foi
levado escravo para a Babilônia.
O rei Zedequias morreu na prisão, e Nabucodonosor sepultou-o
à maneira dos reis. Quanto aos despojos do Templo, ele os consagrou aos seus
deuses. Enviou os escravos dentre o povo para certos lugares, nos arredores da
Babilônia, a fim de que lá vivessem, e pôs Jeozadaque, sumo sacerdote, em
liberdade.
__________________
* Ou Sofonias.
426. Nebuzaradã, posto por Nabucodonosor como governador da
Judéia, deixou lá o povo, os pobres e os fugitivos. Deu-lhes Gedalias, filho de
Aicão, que era de família nobre e homem de bem, como governador e lhes impôs um
tributo em favor do rei. O mesmo Nebuzaradã tirou Jeremias da prisão e rogou
insistentemente ao profeta que o acompanhasse até a Babilônia, pois tinha ordem
do rei, seu senhor, de ali fornecer-lhe tudo o que precisasse. E, caso não o
quisesse seguir, bastava apenas dizer em que lugar gostaria de morar, a fim de
comunicá-lo ao soberano. O profeta disse-lhe que não desejava nem uma coisa nem
outra, mas desejava terminar os seus dias no meio das ruínas de sua pátria,
para não perder de vista aquelas tristes relíquias de tão deplorável naufrágio.
Nabuzaradã ordenou a Gedalias que tivesse dele um cuidado particular e, depois
dar ao santo profeta grandes presentes e de conceder liberdade a Baruque, filho
de Nerias, que também era de família nobre e muito instruída na língua de seu
país, voltou para a Babilônia. Jeremias estabeleceu moradia na cidade de Mispa.
Quando os hebreus que haviam fugido durante o cerco de
Jerusalém e se retirado a diversos lugares souberam do regresso dos babilônios
ao seu país, vieram de todos os lados ter com Gedalias em Mispa. Os principais
eram Jorão, filho de Careá, Jezanias, Seraías e alguns outros. Ismael, que era
de família real, porém muito mau e fingido junto de Batal,* rei dos amonitas,
veio também. Gedalias aconselhou-os a trabalharem as suas terras sem nada mais
temer da parte dos babilônios, que com juramento haviam prometido ajudá-los,
caso alguém os incomodasse. Eles precisavam tão-somente dizer em que cidade
queriam estabelecer-se, e ele daria ordens para as necessárias reparações, a
fim de torná-las habitáveis. E não deveriam deixar passar a estação sem
trabalhar com afinco, para poderem recolher o trigo e fazer vinho e óleo para
se alimentarem durante o inverno. Ele permitiu em seguida que escolhessem os
lugares que desejavam cultivar.
Espalhou-se logo por várias províncias vizinhas da Judéia a
notícia desse fato e da bondade com que Gedalias recebia todos os que se
dirigiam a ele, dando-lhes terras para cultivar, com a condição de se pagar um
tributo ao rei da Babilônia. Assim, muitos vieram procurá-lo de todos os
lugares, e cada qual se pôs ao trabalho com entusiasmo. A grande humanidade de
Gedalias granjeou-lhe depressa o afeto de João** e de todos os outros, até
mesmo das pessoas mais importantes. E eles avisaram-no de que o rei dos
amonitas enviara Ismael com o fim de matá-lo à traição e de se declarar rei de
Israel, pois era de família real. O único meio de remediar o problema era ele
permitir que matassem Ismael, a fim preservar o resto da nação da ruína que
seria inevitável, caso Ismael cumprisse o seu perverso desígnio.
Ele respondeu que não havia a menor probabilidade de Ismael,
que recebera dele somente benefícios, atentar contra a sua vida e que, não
tendo feito más ações durante os dias difíceis que vivera, ousasse cometer
agora tão grande crime contra o seu benfeitor, ao qual deveria ajudar com todas
as suas forças se algum outro o combatesse. Mesmo que fosse verdade aquilo de
que o avisavam, ele preferia correr o risco de ser assassinado a fazer morrer
um homem que viera buscar asilo junto dele e que nele havia confiado.
Trinta dias depois, Ismael, acompanhado por dez de seus
amigos, veio a Mispa visitar Gedalias — que os recebeu e tratou muito bem — e
bebeu diversas vezes à saúde dele, para mostrar-lhe o seu afeto. Quando Ismael
e os que com ele estavam perceberam que o vinho começava a perturbar Gedalias e
que ele adormecera, mataram-no, bem como a todos os outros convidados, que
haviam bebido bastante. Depois, auxiliados pela escuridão da noite, foram
degolar os soldados babilônios e os judeus adormecidos na cidade.
No dia seguinte de manhã, cerca de oitenta pessoas vieram do
campo oferecer presentes a Gedalias. Ismael disse-lhes que falassem com ele.
Depois de entrarem na casa, Ismael e seus cúmplices mataram-nos e os lançaram
num poço muito profundo, para que ninguém percebesse o que se passara, com
exceção de uns poucos que lhe prometeram mostrar no campo o lugar onde haviam
escondido móveis, vestes e trigo. Ismael aprisionou também alguns habitantes de
Mispa, mulheres e crianças, entre as quais estavam as filhas do rei Zedequias,
deixadas por Nebuzaradã sob a custódia de Gedalias. Esse péssimo homem, depois
de cometer tantos crimes, pôs-se a caminho, para voltar ao rei dos amonitas.
João e outros homens da nobreza, seus amigos, ao saber o que
se passara, ficaram muito irritados e reuniram o que puderam de homens armados,
perseguiram Ismael e o alcançaram próximo da fronteira de Hebrom. Os que o
acompanhavam pensaram que João e seus amigos vinham socorrê-los e passaram para
o lado dele, com grandes demonstrações de alegria. Ismael, seguido apenas por
uns oito dos seus, fugiu para o rei dos amonitas. João, seus amigos e os que
ele havia salvado foram a Mandra, onde passaram todo aquele dia, mas ele teve a
idéia de se dirigir para o Egito, temendo que os babilônios os mandassem matar
por causa da morte de Gedalias, que eles lhes haviam dado como comandante.
Antes, porém, foram se aconselhar com Jeremias. Rogaram-lhe que consultasse a
Deus, prometendo com juramento fazer o que Ele ordenasse.
O profeta assim fez, e dez dias depois Deus lhe apareceu e
ordenou que dissesse a João, a seus amigos e a todo o povo que se eles ficassem
onde estavam cuidaria deles e impediria que os babilônios lhes fizessem mal. Se
fossem para o Egito, porém, Ele os abandonaria e lhes infligiria, em sua
cólera, os mesmos castigos que aplicara aos seus outros irmãos. Jeremias
deu-lhes essa resposta da parte de Deus, mas eles não prestaram fé às suas
palavras nem acreditaram que era por ordem de Deus que ele lhes ordenava ficar.
Convenceram-se de que ele dava aquele conselho para ser agradável a Baruque,
seu discípulo, e para expô-los ao furor dos babilônios. Desprezaram então as
ordens de Deus e foram para o Egito, levando com eles também Jeremias e
Baruque. Deus então falou ao seu profeta e ordenou-lhe que dissesse ao seu povo
que o rei da Babilônia faria guerra ao rei do Egito e o venceria. Então parte
deles seria morta, e o resto, levado como escravo para a Babilônia.
Os fatos confirmaram a veracidade dessa profecia, pois cinco
anos depois da ruína de Jerusalém, que era o vigésimo terceiro ano do reinado
de Nabucodonosor, esse soberano entrou com um grande exército na Baixa Síria e
dela se apoderou. Venceu os amonitas e os moabitas e fez depois a guerra ao
Egito. Conquistou-o, matou o rei que então governava e escolheu outro para o
seu lugar. Em seguida, levou como escravos para a Babilônia todos os judeus que
estavam no país.
___________________
* Ou Baalis.
** Ou Joana.
427. A nação dos
hebreus estava então reduzida a esse estado miserável, e por dois fatos foi
duas vezes levada para além do Eufrates. A primeira, quando sob o reinado de
Oséias, rei de Israel, Salmaneser, rei dos assírios, depois de tomar Samaria,
levou escravas dez tribos. A segunda quando Nabucodonosor, rei dos caldeus e
dos babilônios, depois de tomar Jerusalém, levou as duas tribos que restavam.
Salmaneser, porém, mandou para Samaria, da longínqua Pérsia e da Média, os
chuteenses, para que a habitassem. Nabucodonosor, por sua vez, não mandou
colônia alguma para as terras das duas tribos que derrotara. De modo que a
Judéia, Jerusalém e o Templo ficaram desertos durante setenta anos. E assim,
passaram-se cento e trinta anos, seis meses e dez dias desde o cativeiro das
dez tribos que formavam o reino de Israel e o das duas que formavam o reino de
Judá.
428. Daniel 1. Dentre
todos os filhos da nação judaica, parentes do rei Zedequias e outros de origem
mais ilustre, Nabucodonosor escolheu os que eram mais perfeitos e competentes e
deu-lhes preceptores e mestres para que os educassem e instruíssem com grande
cuidado. A alguns fez eunucos, como costumava fazer a todas as nações que
derrotava. Ordenou que os alimentassem com as mesmas iguarias de sua mesa e os
fez aprender não somente a língua dos caldeus e dos babilônios, mas também
todas as ciências em que esses povos eram peritos. Dentre os moços que eram
parentes de Zedequias, havia quatro perfeitamente honestos e inteligentes:
Daniel, Hananias, Misael e Azarias, porém Nabucodonosor trocou-lhes os nomes.
Deu a Daniel o nome de Beltessazar e a Hananias chamou Sadraque, a Misael,
Mesaque e a Azarias, Abede-Nego.
O excelente caráter deles, a beleza de sua inteligência e a
sua grande sabedoria fez com que o príncipe lhes dedicasse um grande afeto.
Eram tão sóbrios que preferiam comer apenas coisas simples, abstendo-se de
seres vivos e das iguarias da mesa real. Assim, rogaram ao eunuco Aspenaz, sob
cujos cuidados estavam, que tomasse para si o que era destinado a eles e lhes
desse somente legumes, tâmaras e coisas semelhantes, que não tivessem tido
vida, porque aqueles manjares os aborreciam. Ele respondeu que faria de muito
boa vontade o que eles desejavam, mas temia que o rei viesse a percebê-lo pela
mudança do rosto deles, porque a cor e a face têm sempre relação com o alimento
que se come, e isso seria ressaltado ainda mais pela diferença entre eles e os
outros moços, alimentados com melhores iguarias. Também não era justo que, para
lhes ser agradável, ele se pusesse em risco de perder a vida.
Quando viram que o eunuco estava disposto a servi-los,
continuaram a insistir e conseguiram dele permissão para experimentar pelo
menos por uns seis dias essa maneira de se alimentar e depois continuá-la, se
não causasse alteração na saúde deles. Caso fosse notada alguma mudança em seus
rostos, retomariam à antiga nutrição. Ele consentiu e, depois de constatar que
não somente eles não se apresentavam mal, como ainda pareciam mais fortes e
robustos que os outros moços de sua idade alimentados com as comidas da mesa do
rei, continuou sem temor a tomar para si o que era destinado a eles e a
alimentá-los do modo como desejavam. O corpo deles tornou-se mais belo e mais
apropriado para o trabalho, e a sua inteligência, mais pronta e capaz, porque
não era enfraquecida pelas delícias que tornam os homens efeminados. Fizeram
grande progresso nas ciências dos egípcios e dos caldeus, particularmente
Daniel, que se dedicou também à interpretação dos sonhos, e Deus o favorecia
com revelações.
429. Daniel 2. Dois anos depois da vitória obtida por
Nabucodonosor sobre os egípcios, esse príncipe teve um sonho estranho, do qual
Deus lhe deu a explicação enquanto ele dormia. Depois que acordou, porém,
esqueceu o sonho e o seu significado. Por isso mandou chamar os maiores sábios
dentre os caldeus, os que se dedicavam à predição do futuro, chamados magos
devido à sua sabedoria. Disse-lhes que tivera um sonho, mas o havia esquecido,
e ordenou-lhes que lhe dissessem qual era e o que significava. Eles responderam
que era impossível aos homens o que ele desejava. Tudo o que podiam fazer era
explicar o sonho depois que ele o tivesse narrado. O rei ameaçou-os de morte se
não obedecessem, e, como continuassem a dizer a mesma coisa, mandou matá-los.
Daniel soube de tudo e, vendo que ele e seus companheiros
corriam o mesmo risco, foi ter com Arioque, comandante da guarda real, para
saber o motivo. Arioque contou, e então Daniel suplicou-lhe que rogasse ao rei
para suspender a execução até o dia seguinte, porque estava confiante de que se
pedisse a Deus para revelar o sonho, Ele ouviria a sua oração. O oficial foi
referir tudo ao rei, e este consentiu em esperar. Daniel e seus companheiros
passaram toda a noite em oração a fim de obter de Deus o livramento para os
magos — e para eles também, pelo perigo em que os colocava a cólera do rei — e
a manifestação do sonho que o rei havia esquecido. Deus, movido de compaixão,
revelou a Daniel o sonho e o seu significado, para que fosse dizê-lo ao rei. A alegria
de Daniel foi tão grande que ele se levantou no mesmo instante para comunicar
aos companheiros a graça recebida de Deus. E, tendo-os encontrado muito
tristes, pensando já na morte, animou-os a tomar coragem e alimentar maiores
esperanças. Deram todos juntos muitas graças a Deus por ter tido piedade de sua
juventude. Logo depois que raiou o dia, Daniel foi pedir a Arioque que o
levasse à presença do rei, a fim de lhe dizer qual fora o sonho.
Apresentando-se diante do soberano, ele disse que, embora fosse
lhe manifestar o sonho, rogava que o não julgasse mais hábil que os magos que
não o puderam fazer, pois na realidade não era mais sábio que eles: a revelação
que tivera foi motivada pela compaixão que Deus sentira pelo perigo em que ele
e seus companheiros se encontravam, por isso Ele lhe revelara o sonho e a sua
significação.
E acrescentou: "Eu, majestade, não estava menos
apreensivo pelo risco que corríamos eu e os meus companheiros que pela tristeza
de ver a injustiça que vossa majestade cometeu, condenando à morte tantos
homens de bem por não terem conseguido fazer uma coisa inteiramente impossível
aos homens, por mais inteligentes que sejam, e que somente Deus pode fazer. E
vossa majestade não estava menos apreensivo pelo risco que corria e estava ansioso
para saber quem dominaria depois de vossa majestade sobre todo o mundo. Deus,
para vos fazer conhecer esses monarcas, fez-vos ver em sonhos uma grande
estátua, cuja cabeça era de ouro, os ombros e os braços de prata, o ventre e as
coxas de bronze e as pernas e os pés de ferro. Vossa majestade viu depois uma
pedra rolar da montanha sobre a estátua, quebrando-a em pedaços e reduzindo-a a
um pó mais fino que a farinha, o qual o vento levou sem que tivesse ficado o
menor vestígio. Por fim, vossa majestade viu essa pedra crescer de tal modo que
esmagou com o seu peso toda a terra. Esse foi, majestade, o vosso sonho, e esta
é a explicação: a cabeça de ouro representa os reis da Babilônia vossos
predecessores. Os ombros e os braços de prata significam que o vosso império
será destruído por dois reis poderosos. As coxas de bronze dizem que outro rei,
vindo do lado do ocidente, destruirá esses dois reis. As pernas e os pés de
ferro mostram que, sendo o ferro mais duro que o ouro, a prata e o cobre, virá
um outro conquistador, que subjugará esse".
Daniel explicou também a Nabucodonosor o que significava a
pedra, mas como o meu intento é narrar somente coisas passadas, e não as que
estão por se realizar, nada mais direi. Se alguém desejar saber mais alguma
coisa em particular, leia nas Sagradas Escrituras o livro de Daniel.
Nabucodonosor, com transportes de alegria e de admiração por Daniel,
prostrou-se diante dele para adorá-lo e ordenou a todos os seus súditos que lhe
oferecessem sacrifícios, como ao seu Deus. Deu-lhe o nome daquEle que ele
reconhecia antes por Deus e honrou-o, bem como aos seus parentes, com os
primeiros cargos no seu império. Essa rápida e prodigiosa felicidade suscitou
tão grande inveja contra essas quatro pessoas que poderia lhes ter custado a
vida, como direi a seguir.
430. Daniel 3.
Nabucodonosor mandou fazer uma estátua de ouro de sessenta côvados de altura e
seis de largura, que foi colocada no grande campo da Babilônia. Quando de sua
consagração, mandou vir de todas as partes de seu território as pessoas mais
importantes e ordenou que ao primeiro som de trom-betas todos se prostrassem
por terra para adorá-la, sob pena de ser lançado numa fornalha ardente quem não
o fizesse. Todos obedeceram à ordem, exceto os amigos de Daniel, que disseram
não poder fazê-lo sem violar as leis de seu país. Imediatamente acusaram-nos, e
foram lançados na fornalha. Mas Deus os salvou por um efeito de seu infinito
poder: o fogo, parecendo reconhecer a sua inocência, respeitava-os, em vez de
consumi-los. Eles venceram as chamas, e tão grande milagre aumentou ainda mais
o respeito e a estima que o rei já lhes devotava, porque os considerava pessoas
de virtude extraordinária e muito particularmente queridos de Deus.
431. Daniel 4. Algum
tempo depois, o príncipe teve outro sonho, no qual parecia que ele fora privado
do reino e passara sete anos no deserto com os animais, sendo em seguida
restaurado à primitiva dignidade. Mandou chamar os magos, contou-lhes o sonho e
perguntou qual o seu significado. Mas nenhum deles soube responder. Daniel foi
o único a explicá-lo, com tal perfeição que tudo o que disse depois se
realizou. O príncipe tornou a subir ao trono depois de haver passado sete anos
no deserto e aplacado a cólera de Deus com uma grande penitência, sem que ninguém
durante todo esse tempo ousasse apoderar-se do trono. Quanto a isso, não devo
ser censurado por narrar o que se pode ler nas Sagradas Escrituras, pois desde
o princípio desta minha história preveni-me dessa acusação, declarando que não
pretendia fazer outra coisa senão escrever em grego, em boa fé, o que encontro
nos livros dos hebreus, sem nada aumentar nem diminuir.
432. Nabucodonosor
morreu após reinar quarenta e três anos. Era um príncipe muito inteligente e
foi muito mais feliz que os seus predecessores. Berose assim o descreve, no seu
terceiro livro da História dos Caldeus: "Nabopolassar, pai daquele de quem
acabamos de falar, tendo sabido que os governadores que ele pusera no Egito, na
Baixa Síria e na Fenícia se haviam revoltado contra ele e não estando mais na
idade de suportar as dificuldades de uma guerra contra eles, enviou
Nabucodonosor, seu filho, com uma parte de suas forças. O jovem príncipe venceu
os rebeldes, recolocou todas as províncias sob a obediência do rei seu pai e,
tendo sabido que naquele mesmo tempo este morrera na Babilônia, após reinar
vinte e um anos, passou a dirigir os destinos do Egito e das outras províncias.
Deixou aos oficiais em quem mais confiava o encargo de levar o seu exército
para a Babilônia com os escravos judeus, sírios, fenícios e egípcios.
Acompanhado por alguns poucos, passou pelo deserto e marchou rapidamente.
Depois de chegar, governou o império que fora administrado na sua ausência
pelos magos caldeus, dos quais o principal e de maior autoridade nada levara
tanto a peito para conservar-lhe o trono. E assim, ele sucedeu em todo o reino
ao rei seu pai. Uma das primeiras coisas que fez foi distribuir em colônias os
escravos recém-chegados. Consagrou no templo de Bel, seu deus, e em outros
templos os ricos despojos que havia conquistado. Não se contentou em restaurar
os antigos edifícios de Babilônia: aumentou também a cidade e fortificou o
canal. Para impedir que a atacassem e a pudessem tomar depois de atravessar o
rio, mandou fazer outro dentro. E fora, ergueu uma tríplice muralha, muito
alta, de tijolos refratários. Fortificou também todas as outras partes da
cidade. Fez portas monumentais e construiu um novo palácio perto do que fora do
falecido rei seu pai, do qual seria inútil referir a beleza e a magnificência.
Não poderia mesmo eu dizer que esse soberbo edifício foi construído em quinze
dias. E, como a rainha, sua mulher, que fora educada na Média, desejava ver
alguma semelhança com o seu país, mandou fazer, para lhe ser agradável, arcos
por cima desse palácio, com grandes pedras que pareciam montes. Mandou cobrir
esses arcos com terra e plantou sobre eles uma tal quantidade de árvores de
todas as espécies que esse jardim, suspenso no ar, passou a ser uma das
maravilhas do mundo".
Megastene, no seu quarto livro da História das índias, faz
menção desse admirável jardim e procura provar que esse príncipe sobrepujou
muito a Hércules pela grandeza de seus feitos e conquistou não somente a
capital da África, mas também a Espanha. Diocles também o cita na História da
Pérsia, e Filóstrato, na da índia e da Fenícia, declarando que ele sitiou
durante trinta anos a cidade de Tiro, da qual Stobal então era rei. Eis tudo o
que pude encontrar nos vários historiadores com relação a esse príncipe.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
NABUCODONOSOR CONSTITUI ZECLEQUIAS REI DEJUDÁ NO LUGAR DE
JOAQUIM. ZEDEQUIAS FAZ ALIANÇA CONTRA ELE COM O REI DO
EGITO.
NABUCODONOSOR CERCA-O EM JERUSALÉM. O REI DO EGITO VEM EM
SEU
AUXÍLIO. NABUCODONOSOR LEVANTA O CERCO PARA COMBATER O REI
DO
EGITO, DERROTA-O E VOLTA PARA CONTINUAR O CERCO. O PROFETA
JEREMIAS
PREDIZ TODAS AS DESGRAÇAS QUE DEVERÃO ACONTECER. METEM-NO
NUMA
PRISÃO E DEPOIS NUM POÇO, PARA FAZÊ-LO MORRER. ZEDEQUIAS
MANDA
RETIRÁ-LO E PERGUNTA-LHE O QUE DEVE FAZER. O PROFETA
ACONSELHA-O A
ENTREGAR JERUSALÉM. ZEDEQUIAS DIZ NÃO PODER TOMAR TAL
DECISÃO.
422. 2 Reis 25. Nabucodonosor, rei da Babilônia, constituiu
Zedequias* rei de Judá no lugar de Joaquim, seu tio paterno, depois de fazê-lo
prometer com juramento que seria fiel e não faria nenhum entendimento com os
egípcios. O soberano tinha então somente vinte e um anos e era irmão de
Jeoaquim — ambos eram filhos do rei Josias. Como mantinha junto de si apenas
jovens de sua idade, que não eram homens de valor, mas ímpios, ele desprezava
também a virtude e a justiça. O povo, à sua imitação, entregava-se a toda sorte
de desordens.
O profeta Jeremias ordenou-lhe diversas vezes, da parte de
Deus, que se arrependesse, se corrigisse e não acreditasse mais nos homens de
mau Espírito que o rodeavam nem nos falsos profetas que o enganavam, afirmando
que o rei da Babilônia não sitiaria Jerusalém e que o rei do Egito far-lhe-ia
guerra e o venceria. As palavras do profeta fizeram impressão no Espírito do
príncipe, e ele queria mesmo seguir aqueles conselhos. Mas os seus favoritos,
que o manipulavam como queriam, faziam-no mudar de opinião.
Ezequiel, que estava então na Babilônia, como dissemos,
predisse também a destruição do Templo e mandou dar a notícia a Jerusalém. Mas
Zedequias não prestou fé às suas profecias porque, embora se assemelhassem em
todo o resto com as de Jeremias, e os dois profetas estivessem de acordo no que
se referia à ruína e ao cativeiro de Zedequias, parecia que eles não combinavam
nisto: Ezequiel afirmava que ele não veria a Babilônia, e Jeremias sustentava
que o rei da Babilônia o levaria prisioneiro para lá. Essa discordância fazia
com que o rei não prestasse fé às profecias. Mas os fatos lhe mostraram a
verdade, como diremos mais detalhadamente a seu tempo.
_____________________
* Zedequias antes chamava-se Matanias.
423. Oito anos
depois, Zedequias renunciou a aliança com o rei da Babilônia para fazer outra,
com o rei do Egito, na esperança de que unindo com este as suas forças aquele
não lhes pudesse resistir. Nabucodonosor, logo que soube disso, pôs-se em campo
com um poderoso exército. Ele devastou a judéia, apoderou-se das maiores
praças-fortes e sitiou Jerusalém. O rei do Egito veio com grandes forças em
auxílio de Zedequias, e então o rei da Babilônia levantou o cerco para dar-lhe
combate. Venceu-o numa grande batalha e o expulsou da Síria. Os falsos
profetas, contudo, depois que Nabudonosor levantou o cerco, continuaram a
enganar Zedequias, dizendo-lhe que, em vez de ter motivo para temor de que ele
fizesse guerra novamente, veria logo o regresso dos seus súditos que estavam na
Babilônia, com todos os vasos sagrados que haviam sido roubados do Templo.
Jeremias, ao contrário, afirmou que aqueles homens o
enganavam ao dar-lhe tal confiança, pois ele nada deveria esperar do auxílio
dos egípcios; que o rei da Babilônia os venceria; que voltaria para continuar o
cerco e tomaria Jerusalém pela fome; que levaria escravizado para a Babilônia o
que restasse dos habitantes, depois de os despojar de todos os seus bens; que
saquearia o Templo e todos os seus tesouros e depois o incendiaria; que
destruiria completamente a cidade; e que esse cativeiro duraria setenta anos,
mas os persas e os medos destruiriam a Babilônia e seu império, e os hebreus,
libertos por eles da escravidão, voltariam a Jerusalém e reconstruiriam o
Templo.
As palavras de Jeremias persuadiram a muitos, no entanto os
príncipes e os que como eles se vangloriavam de serem ímpios zombaram dele,
como de um insensato. Algum tempo depois, indo esse profeta a Anatote, que era
o lugar de seu nascimento, distante vinte estádios de Jerusalém, encontrou no
caminho um dos magistrados, o qual o deteve e o acusou de estar indo procurar o
rei da Babilônia. Jeremias respondeu-lhe que não tinha absolutamente aquela
intenção, ia somente fazer uma visita à sua terra natal. O magistrado, não
acreditando em suas palavras, levou-o perante o tribunal, para instaurar-se o
processo. Declararam-no culpado e meteram-no numa prisão, para fazê-lo morrer.
424. No nono ano do
reinado de Zedequias, no décimo dia do último mês, o rei da Babilônia recomeçou
o cerco de Jerusalém e durante dezoito meses empregou todos os esforços para
apoderar-se dela. E as armas não eram o único meio de que esse soberano se
servia para oprimir os seus habitantes. Eles eram ao mesmo tempo atormentados
por dois dos mais temíveis flagelos: a fome e a peste, ambos violentos e
graves. No entanto jeremias continuava a clamar e a exortar o povo a abrir as
portas ao rei da Babilônia, pois não lhes restava outro meio de salvação, por
maiores que fossem os males vindouros.
Os príncipes e os principais magistrados, em vez de se
convencerem com as palavras do profeta, irritaram-se de tal sorte que o
acusaram perante o rei de ser insensato e de procurar fazer com que eles e todo
o povo perdessem a coragem, predizendo-lhes tantas desgraças. Quanto a eles,
estavam dispostos a morrer pelo serviço do rei e pela sua pátria, ao passo que
aquele sonhador, por meio de ameaças, os exortava a fugir, dizendo que a cidade
seria tomada e que todos pereceriam.
O rei, por uma certa bondade natural e amor à justiça, não
estava irritado contra Jeremias. Porém, temendo em tal contingência
descontentar os maiorais do país, permitiu-lhes fazer o que quisessem. Foram
eles então ao cárcere, tiraram de lá o profeta e o desceram por meio de cordas
a um poço cheio de lama, a fim de que morresse afogado. Ele ficou ali,
mergulhado até o pescoço. Entretanto um criado do rei, que era etíope e gozava
de grande estima perante ele, contou-lhe o que se havia passado, dizendo que
aqueles homens agiam errado ao tratar daquele modo o profeta e que seria muito
melhor deixá-lo morrer na prisão. O rei, comovido com essas palavras,
arrependeu-se de o ter deixado à discrição dos inimigos e ordenou ao etíope que
tomasse trinta de seus oficiais e fosse imediatamente tirá-lo do poço. Ele
executou a ordem no mesmo instante e colocou Jeremias em liberdade.
O rei, em segredo, mandou chamar Jeremias e perguntou se o
profeta não conhecia um meio de obter de Deus um livramento do perigo que os
ameaçava. Ele respondeu que sabia de um apenas, mas seria inútil dizê-lo, pois
estava certo de que aqueles em quem o rei mais confiava, em vez de acreditar,
se levantariam contra ele, como se estivesse cometendo um grande crime ao
declará-lo, e procurariam eliminá-lo. Continuou o profeta: "Onde estão
agora aqueles que vos enganavam, dizendo com tanta certeza que o rei da
Babilônia não voltaria? E, não deverei eu ter medo de dizer-vos a verdade,
sendo que nisso vai a minha vida?" O rei prometeu-lhe com juramento que
ele não correria perigo algum, nem de sua parte nem da parte dos nobres.
Jeremias, tranqüilizado por essas palavras, disse-lhe que o
conselho que lhe dava era por ordem de Deus. Ele deveria entregar a cidade aos
babilônios, nas mãos do próprio rei, pois era o único meio de se salvarem e de
impedir que a cidade fosse destruída e o Templo incendiado. Se não o fizesse,
seria a causa de todos esses males. O rei respondeu que gostaria de seguir o
conselho, mas temia que os seus, os quais se haviam passado para o lado do rei
da Babilônia, viessem prejudicá-lo perante ele e até o matassem. Diante disso,
o profeta garantiu-lhe que, se seguisse o seu conselho, nenhum mal sucederia a
ele nem às suas mulheres e filhos e nem ao Templo.
O rei proibiu-o de contar a quem quer que fosse o que se
passara entre ambos, particularmente aos nobres. Se lhe perguntassem o motivo
da entrevista ou qualquer outra coisa, dissesse apenas que fora pedir para ser
posto em liberdade. Os grandes e os nobres não deixaram de perguntar ao profeta
o que se havia passado entre ele e o rei, e ele respondeu conforme o príncipe
lhe havia ordenado.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento