15 de julho de 2018
História De Israel – Teologia 31.282 (2º Parte Livro 0.3) Prefácio de Josefo
História De Israel – Teologia 31.282
Prefácio de Josefo
De todas as guerras que se travaram, quer de cidade contra
cidade, quer de nações contra nações, nosso século ainda não viu outra tão
grande, e nós não sabemos que tenha havido outra semelhante, à que os judeus
sustentaram contra os romanos. Houve, no entanto, pessoas que se dispuseram a
escrevê-la, embora por si mesmos nada soubessem dela, baseando apenas seus
conhecimentos em relações vãs e falsas. Quanto aos que nela tomaram parte, sua
bajulação pelos romanos e seu ódio pelos judeus, fê-los relatar as coisas de
maneira muito diferente, da que de fato eram na realidade. Seus escritos estão
cheios de louvores de uns e de censuras dos outros, sem se preocupar com a
verdade. Foi isso que me fez decidir a escrever, em grego, para satisfação
daqueles que estão sujeitos ao Império Romano, o que escrevi há pouco em minha
língua, para informar as outras nações.
Meu pai chamava-se Matatias, meu nome é Josefo, sou hebreu
de nascimento, sacerdote em Jerusalém. No princípio combati contra os romanos e
a necessidade, por fim, obrigou-me a empreender a carreira das armas.
Quando essa grande guerra começou, o Império Romano era
agitado por questões internas; os mais jovens e os mais exaltados dos judeus,
confiando em suas riquezas e em sua coragem, suscitaram tão grande perturbação
no Oriente para aproveitar dessa ocasião, que povos inteiros tiveram receio de
lhes ficar sujeitos, porque eles tinham chamado em seu auxílio os outros judeus
que habitavam além do Eufrates, a fim de se revoltarem todos juntamente.
Foi depois da morte de Nero que se viu mudar a face do
império. A Gália, vizinha da Itália, sublevou-se. A Alemanha não estava
tranqüila; muitos aspiravam ao soberano poder; os exércitos desejavam a
revolução na esperança de com isso serem beneficiados. Como todas estas coisas
não poderiam deixar de ser mais importantes, a tristeza que senti por ver que
se desvirtuava a verdade tinha-me já feito tomar cuidado de informar exatamente
aos partos, aos babilônios, mais afastados, entre os árabes, aos judeus que
habitam além do Eufrates e aos atenienses da causa desta guerra; de tudo o que
se passou e de que modo ela terminou; e não posso ainda agora tolerar que os
gregos e os romanos que ali não estavam presentes o ignorem e sejam enganados
por esses historiadores bajuladores que só lhes narram fábulas.
Confesso não poder compreender sua imprudência, quando, para
fazer passar os romanos pelos primeiros de todos os homens, eles queriam
rebaixar os judeus e ajam assim contra sua intenção. Será uma grande glória
superar inimigos pouco temíveis? Ignoram eles as forças poderosas empregadas
pelos romanos nessa guerra, durante o tempo que ela durou e as dificuldades que
suportaram? Não consideram eles que é diminuir a estima do mérito extraordinário
de seus generais diminuir a da resistência que o valor dos judeus fê-los
experimentar na execução de tão difícil empreendimento?
Evitarei bem imitá-los, relevando além da verdade os feitos
dos de minha nação, como eles fizeram com os dos romanos. Farei justiça a uns e
a outros, relatando-os sinceramente; nada afirmarei que não possa provar; não
procurarei outro alívio em minha dor, senão deplorar a ruína da minha pátria.
Mas, o que pode melhor, que o imperador Tito, que teve a direção de toda a
guerra, dela referiu como testemunha, dar a conhecer que nossas divisões
domésticas foram a causa da nossa derrota e que não foi voluntariamente, mas
por culpa daqueles que se tinham tornado nossos tiranos, que os romanos
incendiaram nosso Templo? Esse grande príncipe, não somente teve compaixão
desse pobre povo, vendo-o correr para sua ruína, pela violência daqueles
facciosos, mas ele mesmo, muitas vezes diferiu a tomada da praça, para lhe dar
tempo e ocasião de se arrepender.
Se alguém julgar que meu ressentimento pela infelicidade de
meu país leva-me, contra as leis da história, a acusar fortemente aqueles que
lhe foram autores, que acrescentaram ladroeira pública à sua tirania, devem
perdoar-me e atribuí-lo à minha extrema aflição. Poderia ela ser mais justa, pois
entre tantas cidades sujeitas ao Império Romano não se encontrará uma que como
a nossa, tendo sido elevada a tão alto grau de honra e de glória, tenha caído
em miséria tão espantosa, que não creio que desde a criação do mundo algo se
tenha visto de semelhante. A isso acrescente-se que não é a inimigos externos,
mas a nós mesmos, que devemos atribuir nossas desgraças; como me poderei conter
em tamanha dor? Se, no entanto, se encontrarem pessoas que não se deixem
comover por esta consideração, mas queiram ainda condenar com rigor um
sentimento que me parece tão razoável, poderão ater-se à minha história,
somente nas coisas que eu refiro, e não se incomodar com minhas queixas,
admitindo-as apenas como uma efusão da alma do historiador.
Confesso que muitas vezes censurei, com razão, parece-me, os
mais eloqüentes gregos, porque embora as coisas acontecidas no seu tempo
sobrepujem de muito as dos séculos que os precederam, contentam-se em julgá-las
sem nada escrever e em censurar os que as escreveram, sem considerar que, se
eles lhe são inferiores em capacidade, têm sobre a vantagem de ter servido o
bem público, com seu trabalho; esses mesmos censores dos outros escrevem o que
se passa entre os sírios e os medas, como tendo sido mal narrado pelos antigos
escritores, embora não lhes sejam menos inferiores, na maneira de bem escrever
do que no intento que tiveram, escrevendo-as. Esses primeiros só referiram e
quiseram referir as coisas de que tinham conhecimento e teriam tido vergonha de
falsear a verdade diante daqueles que as tendo visto como eles, poderiam
desmenti-los. Assim, não poderíamos não louvá-los assaz por ter dado à
posteridade o conhecimento do que se passou no seu tempo, que ainda não tinha
aparecido em público; eles devem ser tidos como os mais hábeis, que em vez de
trabalhar sobre as obras de outros e em trocar somente a ordem, escrevem coisas
novas e compõem um corpo de história que somente a eles se deve. Por mim, posso
dizer que, sendo estrangeiro, não houve despesa que eu não fizesse, nem cuidado
que eu não tomasse, para informar os gregos e os romanos de tudo o que se
refere à nossa nação. Os gregos, ao contrário, falam muito quando se trata de
sustentar seus interesses, quer em particular, quer perante os juizes, mas
calam-se quando é preciso reunir com muita dificuldade tudo o que é necessário
para compor uma história verdadeira; e não acham estranho que aqueles que
nenhum conhecimento têm dos feitos dos príncipes e dos grandes generais e são
mui incapazes de os descrever, ousem fazê-lo. Isto mostra que quanto procuramos
a verdade da história tanto os gregos a desprezam e disso se descuidam.
Eu poderia dizer qual foi a origem dos judeus, de que
maneira saíram do Egito, por quais províncias vagaram durante longo tempo, as
que ocuparam e como passaram a outras. Mas, além de que isto não se refere a
este tempo, eu o julgaria inútil, pois vários da minha nação já o escreveram,
com muito cuidado, e os gregos traduziram-lhe as obras para sua língua sem se
afastar muito da verdade.
Assim, começarei minha história por onde seus autores e
nossos profetas terminaram as suas. Referirei particularmente, com toda a
exatidão que me for possível, a guerra que se travou no meu tempo e
contentar-me-ei em tocar brevemente o que se passou nos séculos precedentes.
Direi de que modo o rei Antíoco Epifânio, depois de ter
tomado Jerusalém e de tê-la possuído durante três anos e meio, de lá foi
expulso pelos filhos de Matatias, hasmoneu. Como a divisão suscitada entre seus
sucessores, com relação à posse do reino, atraiu os romanos sob o comando de
Pompeu. Como Herodes, filho de Antípatro, com o auxílio de Sósio, general do
exército romano, pôs fim à dominação desses príncipes hasmoneus. Como depois da
morte de Herodes, sob o reinado de Augusto, Quintílio Varo, governador da
Judéia, o povo se revoltou. Como no décimo segundo ano do reinado de Nero,
começou a guerra; o que se deu sob Céstio, que comandava as tropas romanas; os
primeiros feitos dos judeus e as praças que eles fortificaram. Como as perdas
sofridas em várias ocasiões por Céstio, fizeram Nero temer pelo êxito de suas
armas e ele as entregou a Vespasiano. Como esse general, acompanhado pelo mais
velho de seus filhos, entrou na Judéia com um grande exército romano; como um
grande número de suas tropas auxiliares foi desbaratada na Galiléia, como ele
tomou algumas cidades dessa província e outras se entregaram a ele. Referirei
também sinceramente, segundo o que vi e constatei com meus próprios olhos, o
proceder dos romanos nas suas guerras, sua ordem e sua disciplina: a extensão e
a natureza da alta e da baixa Galiléia, os limites e as fronteiras da Judéia, a
qualidade da terra, os lagos e as fontes, que aí se encontram e os males
suportados pelas cidades que foram tomadas. Não deixarei de falar do mesmo modo
daqueles que experimentei em minha vida e que são bem conhecidos.
Direi também como a morte de Nero aconteceu quando
Vespasiano se apressava para marchar contra Jerusalém, os interesses dos judeus
estavam já em péssimo estado e os do império chamaram-no a Roma; os presságios
que teve da sua futura grandeza; as mudanças sucedidas nessa capital do
império; como foi contra sua vontade declarado imperador pelos soldados e como
foi ao Egito para dar as ordens necessárias; como a Judéia foi agitada por
novas perturbações e como surgiram tiranos, uns contra os outros; como Tito à
sua volta do Egito entrou duas vezes naquela província, de que maneira e em que
lugar ele reuniu seu exército, de que modo e quantas vezes ele viu mesmo em sua
presença sucederem-se as sedições em Jerusalém; suas aproximações e todas as
dificuldades que empreendeu para atacar essa praça; qual a torre dos muros da
cidade, sua fortificação e a do Templo; a descrição do mesmo Templo, suas
medidas e as do altar; nisso nada omitirei. Falarei das nossas festas solenes,
das cerimônias que nelas se observam, das sete espécies de purificação; das
funções dos sacerdotes, suas vestes e os do sumo sacerdote; da santidade desse
Templo, sem nada deturpar, sem nada acrescentar. Farei ver também a crueldade
de nossos tiranos contra os da própria nação e a humanidade dos romanos
conosco, que éramos estrangeiros com relação a eles; quantas vezes Tito fez
tudo o que pôde para salvar a cidade e o Templo e reunir os que estavam tão
obstinadamente divididos. Falarei dos muitos e diversos males suportados pelo
povo, que depois de ter sofrido todas as misérias que a guerra, a carestia e as
sedições podem causar, por fim se viu reduzido à servidão, pela tomada dessa
grande e poderosa cidade. Não me esquecerei também de dizer em que desgraças
caíram os desertores da sua nação, a maneira como o Templo foi queimado, contra
a vontade de Tito, a quantidade de riquezas consagradas a Deus que o fogo
destruiu; a destruição completa da cidade, os prodígios que precederam essa
extrema desolação, a escravidão de nossos tiranos, o grande número daqueles que
foram levados cativos e suas diversas vicissitudes, de que maneira os romanos
perseguiram os que escaparam da guerra e depois de os ter vencido, destruíram
completamente as praças e os lugares para onde eles se haviam retirado. Por
fim, falarei da visita feita por Tito a toda a província para restabelecer a
ordem; da sua volta à Itália e do seu triunfo. Escreverei todas estas coisas em
sete livros, divididos em capítu-los, para satisfação das pessoas que amam a
verdade e não tenho motivo de temer que aqueles que tiveram a direção dessa
guerra ou que lá se encontraram presentes, me acusem de ter faltado à
sinceridade. Mas é tempo de começarmos a executar o que prometi.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
Não perca tempo, Indique esta maravilhosa
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História De Israel – Teologia 31.281 (2º Parte Livro 0.2) Vida de Flávio Josefo Escrita por Ele mesmo Parte 5
História De Israel – Teologia 31.281
Vida de Flávio Josefo
Escrita por Ele mesmo Parte 5
É aqui, Justo, que devemos falar da vossa cidade. Ela está
situada junto do lago Genesaré, longe de Hippos, trinta estádios, sessenta, de
Gabara, e cento e vinte de Citopolis, que está sob a dominação do rei. Não está
perto de nenhuma aldeia dos judeus. Que vos impedia, portanto, de continuar
fiel aos romanos, pois que tínheis grande quantidade de armas em particular e
em público? Se responderdes que eu então fui a causa disso, eu vos pergunto,
quem o foi, depois? Podeis ignorar que antes do cerco de Jerusalém eu tinha
sido sitiado em Jotapate, que vários outros castelos tinham sido tomados e que
um grande número de galileus tinham sido mortos em vários combates? Se, então,
não foi voluntariamente, mas por coação que tomastes as armas, quem então vos
impedia de abandoná-las e vos colocardes sob a obediência do rei e dos romanos,
pois não tínheis mais nenhum temor de mim? Mas o que é verdade é que esperastes
até que vistes Vespasiano chegar, com todas as suas tropas, às portas de vossa
cidade e então, o temor do perigo vos desarmou. Não poderíeis, no entanto,
evitar ser obrigado pela força e levados ao saque, se o rei não tivesse obtido,
da clemência de Vespasiano, o perdão de vossa loucura. Não foi, pois, minha
culpa, mas vossa, e vossa ruína só veio porque sempre fostes no coração inimigo
do império. Esquecestes de que, em todas as vantagens que obtive sobre vós,
jamais quis mandar matar alguns dos vossos, ao passo que as divisões que
cindiram vossas cidades, não por vosso afeto pelo rei e pelos romanos, mas por
vossa própria malícia, custaram a vida a cento e oitenta e cinco dos vossos
concidadãos, durante o tempo em que eu estive sitiado em Jotapate? Não foram
encontrados em Jerusalém, durante o cerco, dois mil homens em Tiberíades, dos
quais alguns foram mortos e os outros feitos prisioneiros? Direis para provar
que não éreis inimigos dos romanos, que vos tínheis então retirado para junto
do rei? Não direi, ao contrário, que vós o fizestes apenas pelo medo que
tínheis de mim? Se eu sou mau, como vós apregoais, que sois vós então, vós a
quem o rei Agripa salvou a vida, quando Vespasiano vos havia condenado à morte;
vós, que ele não deixou de mandar por duas vezes à prisão, embora lhe tivésseis
dado bastante dinheiro vós; que ele mandou duas vezes ao exílio; vós, que ele
teria feito morrer, se Berenice, sua irmã, não vos tivesse obtido o perdão e em
quem, por fim, ele constatou tanta infidelidade no cargo de secretário, com que
ele vos havia honrado, que vos proibiu de vos apresentardes jamais em sua
presença? Não quero continuar a falar. De restante, admiro a ousadia com a qual
afirmais ter escrito esta história, mais exatamente que qualquer outro, vós,
que não sabeis somente o que se passou na Galiléia — pois estáveis então em
Baruque junto do rei — e não podeis saber o que os romanos sofreram no cerco de
jotapate, nem de que modo eu procedi nessa ocasião, pois não me seguistes e não
ficou um sequer, dos que me ajudaram a defender aquela praça, para vos vir
trazer as notícias. Se disserdes que narrastes com mais exatidão o que se
passou no cerco de Jerusalém, eu vos pergunto, como isso pode ser, pois lá não
vos encontrastes e não lestes o que Vespasiano escreveu a respeito? Isso eu
posso afirmar, sem temor, vendo que escrevestes o contrário. Se julgais que
vossa história é mais fiel do que qualquer outra, porque não a publicastes
enquanto Vespasiano vivia e Tito também, seu filho, que tiveram o comando de
toda essa guerra, e enquanto viveu o rei Agripa, bem como seus parentes, que
eram tão peritos na língua grega? Pois a escrevestes vinte anos antes, e
podíeis então ter por testemunhas da verdade aqueles que tinham visto tudo com
os próprios olhos. Mas esperastes para publicá-la depois da morte deles, a fim
de que ninguém vos pudesse acusar de não ter sido fiel.
Eu não fiz o mesmo, porque não temia a ninguém. Mas, ao
contrário, entreguei a minha a esses dois imperadores, quando esta guerra
estava apenas terminada e a memória dos fatos ainda era recente, porque minha
consciência me dizia que só tendo dito a verdade, ela seria aprovada por
aqueles que lhe poderiam dar testemunho; e nisto não me enganei. Eu a
comuniquei imediatamente a muitos, dos quais a maior parte estivera presente a
esta guerra, no número dos quais estavam o rei Agripa e alguns dos seus
parentes. O próprio imperador Tito quis que a posteridade não tivesse
necessidade de haurir numa outra fonte a notícia de tão grandes feitos; depois
de tê-la assinado com sua própria mão, ele ordenou que fosse publicada. O rei
Agripa escreveu-me também sessenta e duas cartas, que dão testemunho da verdade
das coisas que referi. Apresentarei aqui apenas duas, para provar o que estou
dizendo:
"O rei Agripa, a Josefo, seu mui caro amigo, saudação.
Eu li vossa história com grande prazer e a achei muito mais exata que todas as
outras. Por isso, rogo-vos, que me mandeis a continuação. Adeus, meu caro
amigo."
"O rei Agripa a Josefo, seu mui caro amigo, saudação. O
que escrevestes fez-me ver que não tendes necessidade de minhas instruções para
dizer como todas as coisas se passaram. No entanto, quando eu vier, poderei
dizer-vos alguns particulares, de que não sabeis."
Vê-se, assim, de que modo esse príncipe, não por uma
bajulação indigna da sua condição, nem por zombaria, tão longe do seu caráter,
quis dar testemunho da verdade. Eis o que justo obrigou-me a dizer, para minha
justificativa, e devemos agora retomar a continuação da minha narração.
Depois de ter acalmado as perturbações de Tiberíades, propus
a meus amigos o assunto sobre João; deliberei com eles os meios de castigá-lo.
Seu parecer foi de se reunirem todas as forças de meu governo e marchar contra
ele, porque era ele a única causa de todo o mal. Mas eu não estava de acordo
com esse projeto, porque desejava acalmar a província sem derramamento de
sangue, e para isso lhes ordenei que se informassem bem exatamente de todos os
que seguiam o seu partido. Mandei, ao mesmo tempo, publicar uma ordem pela qual
eu prometia esquecer todo o passado, em favor daqueles que se arrependessem por
terem faltado ao dever e dentro de vinte dias voltassem à obediência; caso não
quisessem deixar as armas, eu ameaçava queimar-lhes as casas e expor seus bens ao
saque. Esta ameaça assustou-os tanto que quatro mil abandonaram João, deixaram
as armas e se entregaram. Os habitantes de Giscala, seus compatriotas, e mil e
quinhentos estrangeiros tírios foram os únicos que ficaram com ele. Esse meu
modo de agir me saiu tão bem, que o temor os obrigou a ficar em seu país.
Os de Séforis, que confiavam na força de suas muralhas e que
me viam ocupado em outros lugares, tomaram as armas, nesse mesmo tempo, e
mandaram pedir a Céstio Galo, governador da Síria, que viesse rapidamente tomar
posse de sua cidade, ou lhes enviasse pelo menos uma guarnição. Ele o prometeu,
mas não marcou o tempo; logo que recebi este aviso, reuni minhas tropas,
marchei contra eles e tomei a cidade de assalto. Os galileus, então, não
querendo perder esta ocasião de se vingar dos seforitanos, que odiavam
mortalmente, tudo fizeram para destruir a cidade e os habitantes. Os homens
haviam-se retirado para a fortaleza e então incendiaram as casas que haviam
abandonado, saquearam a cidade, e não puseram obstáculo ao próprio
ressentimento. Essa desumanidade causou-me profunda dor. Ordenei-lhes que
cessassem o saque, fazendo-lhes ver que não deviam tratar daquele modo a
pessoas de sua própria tribo. Vendo, porém, que nem minhas ordens, nem meus
rogos podiam detê-los, tão violenta era sua animosidade, dei ordem aos mais
fiéis dos meus amigos que fizessem correr a notícia de que os romanos estavam
entrando pelo outro lado da cidade, com um poderoso exército. Este expediente
deu resultado. O temor que este boato lhes causou fê-los deixar o saque, para
só pensar em fugir, vendo que eu também fugia, pois, para confirmar ainda mais
a notícia, fingia ter tanto medo como eles.
Eis o recurso de que me servi para salvar os seforitanos,
quando estes não mais tinham esperanças de salvação; pouco faltou para que os
galileus saqueassem também Tiberíades, como vou narrar. Alguns dos principais
Senadores escreveram ao rei para rogar-lhe que viesse tomar posse de sua
cidade. Ele respondeu-lhes que viria dentro de poucos dias, entregando a carta
a um de seus criados, de nome Crispo, judeu de nascimento. Os galileus
prenderam-no, a caminho, reconheceram-no e mo trouxeram; quando souberam o que
a carta dizia, ficaram tão agitados, que se reuniram, tomaram as armas e no dia
seguinte foram procurar-me em Azoque, clamando que os de Tiberíades eram
traidores, amigos do rei e pediam-me que lhes permitisse ir destruí-los, pois
odiavam Tiberíades, não menos que Séforis. A este respeito, eu não sabia que
resolução tomar para salvar Tiberíades de seu furor, porque não podia negar que
os habitantes daquela cidade tinham apelado para o rei porque a sua resposta mo
fazia ver mui claramente. Por fim, depois de ter pensado bastante na maneira de
como lhes devia responder, disse-lhes que a culpa dos de Tiberíades era
inescusável e eu não queria impedir que saqueassem a cidade, mas que em
semelhantes ocasiões, era necessário usar-se de muita prudência. E, assim, pois
que os de Tiberíades não eram os únicos traidores da liberdade pública, mas
vários dentre os principais dos galileus seguiam-lhes o exemplo, eu era de
opinião que se fizesse uma indagação bem cuidadosa de todos os culpados, a fim
de castigá-los todos juntamente, como mereciam. Estas palavras acalmaram-nos e
eles se dispersaram.
Alguns dias depois, fingi ser obrigado a fazer uma pequena
viagem e mandei chamar secretamente esse criado do rei, que havia ordenado pôr
na prisão. Disse-lhe que procurasse embriagar o soldado que o guardava e
fugisse para junto de seu senhor. Deste modo, Tiberíades, que estava pela
segunda vez a ponto de perecer, foi salva por meu intermédio.
Quando estas coisas assim se passavam, Justo, filho de
Pisto, foi para junto do rei, escapando, sem que eu o soubesse; esta foi a
causa da fuga: no começo da guerra dos judeus contra os romanos, os de
Tiberíades tinham resolvido não se revoltar contra eles e submeteram-se à
obediência do rei. Mas Justo persuadiu-os a tomar as armas na esperança de que
a perturbação e as mudanças dar-lhe-iam ocasião de se apoderar do governo e de
se tornar senhor da Galiléia e de seu próprio país. Não obteve, no entanto, o
seu desígnio, porque os galileus, anima-dos contra os de Tiberíades pela
recordação dos males que deles haviam recebido antes da guerra, não quiseram
tolerar a sua dominação; quando fui enviado de Jerusalém para governar a
província, fiquei diversas vezes tão encolerizado contra ele por causa da sua
perfídia, que pouco faltou que eu não o mandasse matar. O temor que com isso
ele sentiu obrigou-o a se retirar para junto do rei, onde julgou poder viver em
segurança.
Os seforitanos, que se viram contra toda esperança salvos de
grande perigo, enviaram a Céstio Galo embaixadores, para lhe pedir que viesse
prontamente à sua cidade, ou pelo menos mandasse tropas bastante fortes para
defendê-los e impedir os ataques dos seus inimigos. Ele concedeu-lhes aquele
favor e à noite, mandou-lhes tropas de infantaria e de cavalaria. Quando vim a
saber que essas tropas devastavam as terras dos arredores, reuni as minhas, e
fui acampar em Gerizim, distante vinte estádios de Séforis. À noite,
aproximei-me das muralhas, escalei-as e meus soldados se apoderaram de uma boa
parte da cidade. Mas, como eles não conheciam bem todos os lugares, fomos
obrigados a nos retirar, depois de ter matado doze soldados, dois cavaleiros
romanos e alguns habitantes, sem perder um único homem. Poucos dias depois
travamos um combate na planície, onde depois de termos sustentado com muita
coragem o ataque da cavalaria dos romanos, os meus, vendo-me rodeado pelos
inimigos, ficaram assustados e fugiram; justo, um dos meus guardas e que
outrora fora guarda do rei, foi morto nessa ocasião.
Sila, comandante dos guardas desse príncipe, veio em seguida
com um grande número de soldados de infantaria e de cavalaria acampar a cinco
estádios de juliada e deixou uma parte de suas tropas na estrada de Cana e do
castelo de Gamala, para impedir que para lá se levassem víveres. Logo que vim a
saber disso, mandei jeremias com dois mil homens acampar perto do Jordão, a um
estádio de juliada, vendo que eles só cediam pequenas escaramuças, fui
reunir-me a eles com três mil homens, coloquei no dia seguinte as forças de
emboscada num vale mui perto do acampamento dos inimigos e procurei trazê-los
ao combate, depois de ter dado ordem aos meus soldados de fingir uma fuga; isso
deu resultado. Como Sila pensou que eles fugiam de verdade, perseguiu-os até
aquele lugar e encontrou então tropas, de que nem sequer suspeitava. Mandei
então que meus homens fizessem meia volta, ataquei com tal ímpeto os inimigos,
que os obriguei a fugir; teria obtido sobre eles uma assinalada vitória, se a
sorte não se tivesse oposto à felicidade. Meu cavalo caiu sobre mim,
atirando-me a um pântano; fiquei tão ferido numa das mãos que fui obrigado a ir
a uma aldeia próxima de nome Cefarnom; os meus, que me julgavam ainda mais
ferido do que na verdade eu estava, ficaram tão perturbados que deixaram de
perseguir os inimigos. A febre assaltou-me e depois que me medicaram,
levaram-me a Tariquéia. Sila soube-o, criou ânimo e imaginando que minhas
tropas estavam desprevenidas, mandou à noite, para além do Jordão, uma
companhia de cavalaria, que colocou em emboscada; ao despontar do dia atacou os
meus, que resistiram firmemente. Aquela cavalaria apareceu, então, atacou,
dispersou-os e os pôs em fuga. Somente uns seis morreram, porque correu a voz
de que nossas tropas estavam para chegar de Tariquéia e Júlia, e então os
inimigos fugiram.
Pouco tempo depois, Vespasiano chegou a Tiro, acompanhado
pelo rei Agripa, e os habitantes fizeram-lhe grandes queixas desse príncipe,
dizendo que ele era seu inimigo e do povo romano e que Filipe, general de seu
exército, tinha, por sua ordem, traído a guarnição romana de Jerusalém e os que
estavam no palácio real. Vespasiano censurou-os acremente por ousarem daquele
modo ultrajar a um rei amigo dos romanos e aconselhou Agripa a mandar Filipe a
Roma prestar contas de suas ações. Ele partiu para esse fim; mas não se avistou
com o imperador Nero, porque o encontrou nos extremos do perigo em que a guerra
civil o tinha reduzido; e assim voltou para junto de Agripa.
Quando Vespasiano chegou a Ptolemaida, os principais
habitantes de Decápolis acusaram Justo, perante ele, de ter incendiado suas
aldeias. Vespasiano, para satisfazê-los, entregou-o ao rei, como sendo seu
súdito; o soberano, sem nada lhe dizer, mandou-o para a prisão, como vimos há
pouco.
Os de Séforis compareceram então à presença de Vespasiano e
receberam uma guarnição dele, comandada por Plácido, ao qual eu fiz a guerra
até que Vespasiano entrou na Galiléia. Escrevi mui exatamente na minha História
da Guerra dos Judeus, o que se refere à vinda desse imperador; como depois do
combate de Tariquéia eu me retirei a Jotapate; como, depois de aí ter estado
por muito tempo cercado, caí nas mãos dos romanos; como fui em seguida
libertado da prisão; e, por fim, tudo o que se passou nessa guerra e no cerco
de Jerusalém. Assim, não me resta que falar do que se refere a mim em
particular, que ainda não foi relatado.
Depois da tomada de Jotapate, os romanos, que me haviam
aprisionado, vigiavam-me severamente; mas Vespasiano não deixava de me prestar
muitas honras e desposei, por sua ordem, uma moça de Cesaréia, que era também
escrava. Ela não ficou muito tempo comigo, pois quando fui libertado da prisão,
segui Vespasiano a Alexandria e ela me deixou. Desposei outra na mesma cidade,
de onde fui mandado, com Tito, a Jerusalém e me encontrei diversas vezes em
grave perigo de vida, pois os judeus tudo faziam para me matar. Todas as vezes
que a sorte das armas não era favorável aos romanos, eles diziam que era eu que
os traía, e insistiam muito com Tito, que então tinha sido declarado César, que
mandasse me matar. Mas como esse príncipe bem conhecia as vicissitudes da
guerra, nada respondia a essas queixas. Ele me permitiu, mesmo diversas vezes
depois da tomada de Jerusalém, tomar a parte que eu quisesse no que restava das
ruínas do meu país. Nada, porém, era capaz de me consolar em tão grande
desolação e me contentei de lhe pedir os livros sagrados e liberdade de algumas
pessoas, o que ele de boa vontade me concedeu. Pedi-lhe também a liberdade de
um meu irmão e de cinqüenta de meus amigos, que ele me concedeu do mesmo modo;
tendo entrado, com sua licença, no Templo, lá encontrei no meio de uma grande
multidão de escravos, tanto de homens como de mulheres e crianças, mais ou
menos cento e noventa amigos meus, ou conhecidos, que foram todos libertados, a
meu rogo, sem pagar resgate e restaurados em seu primitivo estado.
Tito mandou-me em seguida com Cerealis e mil cavaleiros a
Técua, para ver se aquele lugar seria próprio para um acampamento. Ao meu
regresso, soube que tinham crucificado vários escravos, dentre os quais
reconheci três amigos meus. Fiquei muito sentido e fui, banhado em lágrimas,
dizer a Tito o motivo de minha aflição. Ele ordenou no mesmo instante que os
tirassem da cruz e que os curassem com todo o cuidado. Dois deles morreram nas
mãos dos médicos, mas o terceiro sobreviveu.
Depois que Tito pôs em dia todos os problemas da Judéia e
toda a região estava tranqüila, vendo que as terras que eu tinha nos arredores
de Jerusalém ser-me-iam inúteis por causa das tropas romanas, que eram
obrigadas a lá permanecerem, para a defesa do país, ele deu-me outras em
lugares mais afastados e quando voltou a Roma, concedeu-me a honra de subir ao
seu navio. Quando chegamos, Vespasiano tratou-me da melhor maneira possível.
Fez-me hospedar no palácio em que ele morava antes de ser imperador, quis que
fosse recebido no número dos cidadãos romanos, deu-me uma pensão, sem nada
diminuir dos seus benefícios para comigo; isso causou contra mim tamanha inveja
dos meus compatriotas, que me pôs em grande perigo. Um judeu chamado jônatas,
tendo provocado uma rebelião em Cirene e reunido dois mil homens da região, que
foram todos severamente castigados, foi mandado, atado de pés e mãos ao
imperador e ele acusou-me falsamente de lhe ter fornecido armas e dinheiro;
Vespasiano, porém, não acreditou na sua impostura e mandou cortar-lhe a cabeça;
Deus livrou-me ainda de outras falsas acusações dos meus inimigos, e Vespasiano
deu-me na Judéia uma propriedade de grande extensão.
Nesse mesmo tempo, os costumes de minha mulher se me
tornaram insuportáveis; eu a repudiei, embora tivesse três filhos dela, dois
dos quais haviam morrido, restando-me apenas Hircano. Desposei outra, de Creta,
judia de nascimento, filha de pais nobres e muito virtuosa. Dela tive dois
filhos, Justo e Simão, cognominado Agripa. Este é o estado dos meus assuntos
domésticos. A isso devo acrescentar que continuei a ser sempre honrado com a
benevolência dos imperadores, pois Tito não ma demonstrou menos que Vespasiano,
seu pai, e jamais escutou as acusações que se faziam contra mim. O imperador
Domiciano, que o sucedeu, acrescentou novos favores aos que eu já havia
recebido, mandou cortar a cabeça a judeus que me haviam caluniado e castigar um
escravo eunuco, pre-ceptor de meu filho, que era do seu número. Este soberano
acrescentou a tantos favores um sinal de honra mui ilustre, como libertar todas
as terras que eu possuía na Judéia, e a imperatriz Domícia sempre teve prazer
em me obsequiar. Poder-se-á por este reduzido resumo dos fatos de minha vida
imaginar quem fui eu. Quanto a vós, ó mui virtuoso Epafrodita, depois de vos
ter dedicado a continuação das minhas antigüidades, não vos direi mais coisa
alguma.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
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14 de julho de 2018
História De Israel – Teologia 31.280 (2º Parte Livro 0.2) Vida de Flávio Josefo Escrita por Ele mesmo Parte 4
História De Israel – Teologia 31.280
Vida de Flávio Josefo
Escrita por Ele mesmo Parte 4
no exercício do meu cargo, não me contento de apresentar
três testemunhas; eu apresento todos os que vedes diante de vós. Interrogai-os
sobre minhas ações e eles vos dirão se encontraram algo de repreensível em mim.
E vós todos, acrescentei, dirigindo-me aos galileus, o maior prazer que me
poderíeis dar, é não dissimular a verdade, mas declarar corajosamente diante
desses senhores, como se eles fossem nossos juizes, se eu cometi alguma ação
digna de reprovação, no exercício do meu cargo."
Depois de ter assim falado, todos, a uma voz, disseram que
eu era seu benfei-tor e defensor, afirmaram que aprovavam todos os meus atos e
rogaram-me que continuasse a governá-los como tinha feito até então, afirmando
todos com juramento, que eu jamais tinha permitido que se atentasse à honra de
suas esposas, nem lhes havia causado desprazer algum. Li depois, em voz bem
alta, que todos os galileus puderam ouvir, as duas cartas de Jônatas, que
tinham sido interceptadas e em que me acusavam, por pura calúnia, de ter agido
mais como tirano do que como governador. E como não queria que eles soubessem
como elas tinham vindo parar em minhas mãos, para que continuassem a escrever,
disse que os mesmos mensageiros mas haviam entregue. Estas cartas irritaram de
tal modo toda aquela multidão, contra Jônatas e seus colegas, que se lançaram
sobre eles e os teriam sem dúvida matado, se eu a não tivesse impedido. Eu
disse a Jônatas que perdoava tudo o que tinha feito contra mim, contanto que
mudassem de proceder e voltassem a Jerusalém, para dizer aos que o haviam
mandado, de que maneira eu havia procedido no meu cargo. Eles prometeram-no e
os despedi, embora não duvidasse de que me faltariam à palavra dada. O furor do
povo porém, continuava, e todos me pediam que permitisse castigá-los; embora
procurasse, com todas as minhas forças, moderar-lhes a cólera e persuadi-los a
perdoá-los, fazendo-lhes ver que não há sedição que não seja prejudicial ao
povo, eles queriam a todo custo atacar a residência de Jônatas.
Vendo, então, que já não estava mais em mim contê-los,
montei a cavalo e ordenei-lhes que me seguissem a Sogam, aldeia da Arábia,
longe do lugar onde eu estava uns vinte estádios e assim consegui impedir que
me acusassem de ter começado uma guerra civil. Chegando a Sogam, mandei minhas
tropas fazer alto, e depois de os ter avisado de que não se deixassem levar
facilmente pela cólera, eu disse a uns cem dos mais ilustres dos galileus, pela
condição como pela idade, que se preparassem para ir a Jerusalém, a fim de
denunciar os que perturbavam a província; disse-lhes ainda que fizessem o povo
compreender a razão, sendo preciso levá-los a escrever-me cartas pelas quais me
confirmariam no governo da Galileia e ordenariam a João que se afastasse. Eles
partiram três dias depois com estas ordens e dei-lhes quinhentos soldados para
acompanhá-los. Escrevi também a alguns dos meus amigos da Samaria para que
cuidassem da sua segurança durante a viagem, pois aquela cidade já estava
sujeita aos romanos e como aquele caminho era o mais curto, eles não teriam
podido, se não o tivessem tomado, chegar a Jerusalém dentro de três dias. Eu os
conduzi até a fronteira, coloquei guardas nas estradas para impedir que se
pudesse temer algo com sua partida e fiquei alguns dias em Jafa.
Jônatas e seus colegas, vendo que todos os seus desígnios
lhes haviam saído tão mal, mandaram João a Giscala e foram a Tiberíades, na
esperança de se assenhorear dela, porque Jesus, que então lá exercia a soberana
magistratura, lhes havia prometido persuadir o povo a recebê-los e submeter-se
a eles. Sila, que lá eu havia deixado como meu lugar-tenente, avisou-me logo do
que se passava e insistiu que eu voltasse imediatamente; fazendo-o, expus-me a
um grande perigo, pelo fato que passo a narrar: Jônatas e seus colegas, que já
haviam chegado a Tiberíades, onde haviam levado vários dos habitantes que não
me apreciavam, a se revoltar contra mim, ficaram muito admirados pela minha
chegada; vieram ter comigo e depois de ter-me saudado, disseram-me que se
regozijavam com a honra que eu havia conquistado pela maneira como havia
procedido no meu cargo, que nela tinham parte, como meus concidadãos.
Protestaram em seguida que minha amizade lhes era muito mais importante do que
a de João e rogaram-me que voltasse com garantia que me davam de entregá-lo mui
breve em minhas mãos. Confirmaram-no com juramentos tão terríveis e tão
sagrados entre nós, que eu julguei, em consciência, dever prestar-lhes fé; e,
para que eu não julgasse estranho, eles insistiram tanto no meu afastamento,
disse-ram-me que o dia de sábado se aproximava e eles desejavam impedir que
acontecesse alguma perturbação no meio do povo.
Como de nada desconfiava, retirei-me para Tariquéia, mas
deixei na cidade algumas pessoas com o encargo de observar tudo o que se diria
de mim e o comunicassem aos que eu havia deixado em vários lugares, pelo
caminho que vai de Tiberíades a Tariqueia, a fim de me darem a notícia com a
máxima rapidez. No dia seguinte, todo o povo se reuniu num lugar bastante amplo
que era destinado à oração. Jônatas também lá estava e, não ousando falar
abertamente de revolta, contentou-se em dizer que a cidade precisava mudar de
governador. Mas Jesus, que era o principal magistrado, acrescentou, sem nada
dissimular, que lhes era muito mais vantajoso obedecer a quatro pessoas do que
a uma só, tanto mais que as quatro eram de origem ilustre e de singular
prudência; e, assim falando, mostrava Jônatas e os colegas; Justo louvou esse
conselho e atraiu alguns dos habitantes à sua opinião.
No entanto, o povo não participou desses sentimentos e teria
sucedido certamente uma revolta, se a sexta hora do dia, que no sábado nos
obriga a ir cear, não tivesse soado. A assembléia foi transferida para o dia
seguinte e os deputados regressaram sem nada ter obtido. Logo que eu soube do
ocorrido, resolvi ir bem cedo a Tiberíades; partindo de Tariqueia ao despontar
do dia, achei o povo já reunido no oratório, sem saber porque lá se encontrava.
Jônatas e seus colegas, muito surpreen-didos por me verem, fizeram correr o
boato de que a cavalaria romana tinha aparecido perto de Homonea, distante
apenas trinta estádios da cidade. Clamaram, então, que não se devia tolerar que
os inimigos viessem, à vista de todos, saquear os campos. Isso diziam com o fim
de me obrigar a sair para socorrer os habitantes da planície e ficar senhores
da cidade, conquistando, com meu prejuízo, o afeto dos habitantes. Facilmente
compreendi o ardil, e fiz o que eles desejavam, para não dar motivo aos de
Tiberíades de dizer que eu me descuidava da sua segurança.
Saí, pois, rapidamente e vi que não havia o menor indício do
boato que eles haviam feito correr. Voltei logo e achei o Senado e o povo já
reunidos, e jônatas fazia um discurso inflamado contra mim, dizendo que eu
desprezava o cuidado da guerra e só pensava em me divertir. Para isso,
apresentava quatro cartas que ele afirmava ter recebido dos galileus das
fronteiras, pelas quais lhe pediam um auxílio urgente contra os romanos, que
ameaçavam entrar, dentro de três dias, em seu país com um grande número de soldados
de infantaria e de cavalaria. Os de Tiberíades facilmente acreditaram nessa
acusação e se puseram a gritar que não havia tempo a perder, para que eu fosse
remediar imediatamente a um perigo tão grave.
Embora eu bem compreendesse o desígnio de Jônatas, não
deixei de dizer que estava pronto para marchar, mas, que as quatro cartas que
ele havia apresentado, tendo sido escritas de quatro lugares igualmente
ameaçados, seria necessário distribuirmos todas as nossas tropas em cinco
corpos, que seriam comandados pelos deputados de Jerusalém respectivamente,
pois, tão valentes como eles eram, deviam ajudar a república também com suas
pessoas, bem como com seus conselhos. Esta proposta agradou a todo o povo que
insistia que a executássemos. Os deputados, ao contrário, ficaram muito
perturbados, por verem que eu havia novamente posto por terra seus projetos. A
esse respeito, Ananias, um deles, homem muito mau e muito astucioso, propôs
publicar-se um jejum para o dia seguinte e que cada qual se dirigisse sem armas
ao mesmo lugar, à mesma hora, para mostrar que nada eles poderiam fazer sem o
auxílio e a assistência de Deus. Isso não dizia por zelo pela religião, mas
para me desarmar e a todos os meus. Eu fui, no entanto, obrigado a consentir,
para que não parecesse que desprezava o que parecia ser grande demonstração de
piedade.
Logo que se dissolveu a assembléia, Jônatas e seus colegas
escreveram a João, para que viesse ter com eles no dia seguinte, com o maior
número possível de soldados para me prender e assim conseguir o que ele
desejava, naquela fácil contingência. Estas cartas muito o alegraram e ele
procurou pôr-se em condições de executar tal projeto. No dia seguinte, eu disse
a dois dos meus guardas, mui valentes e mui fiéis, que escondessem espadas
curtas sob as vestes e me acompanhassem, a fim de que, se fosse necessário,
pudéssemos nos defender dos inimigos. Tomei também uma couraça e uma espada que
não se viam e fui ao lugar onde se haviam reunido. Chegando com meus amigos,
Jesus, que estava à porta, não permitiu a nenhum dos meus entrar e, quando se
ia começar a oração, ele me perguntou o que eu havia feito dos móveis e do
dinheiro, não em moedas, que haviam tomado no palácio do rei, quando o haviam
incendiado; isso ele fazia apenas para ganhar tempo, até que João chegasse. Eu
respondi que havia entregue tudo a Capella e a dez dos principais habitantes de
Tiberíades e que podia perguntar-lhes se eu não estava dizendo a verdade.
Capella e os outros afirmaram que era mesmo assim. Jesus perguntou-me em
seguida o que eu havia feito de vinte peças de ouro que havia tirado de alguns
móveis que tinha posto à venda. Respondi que as havia fornecido àqueles que
mandara a Jerusalém, para as despesas de sua viagem. Jônatas e seus colegas
disseram, então, que eu havia feito mal, pagando-as, às expensas do público.
Tão grande malícia irritou o povo; quando vi que ele estava prestes a se
rebelar, disse para incitá-lo ainda mais que se eu tinha feito mal em dar
aquelas vinte peças de ouro do dinheiro público, me prontificaria a pagar do
meu, para que eles terminassem as suas queixas. Estas palavras fizeram ver até
que ponto chegava a sua injustiça contra mim e o povo fremiu ainda mais; quando
Jesus viu que esse assunto tomava um rumo totalmente contrário ao que eles
haviam esperado, ordenou ao povo que se retirasse e disse que somente o Senado
deveria ficar, porque essa espécie de assunto não devia ser tratada de forma
tumultuada.
O povo, porém, disse que não me queria deixar sozinho com
eles, e nesse momento um homem veio dizer baixinho a Jesus que João já estava
perto com suas tropas. Jônatas não pôde mais se conter, e Deus assim o fez,
talvez, para me salvar, pois de outro modo não poderia ter evitado minha morte,
nas mãos de João. "Deixai", disse ele, "habitantes de Tiberíades,
de vos incomodar por causa dessas vinte peças de ouro, porque não é por esse
motivo que Josefo merece ser morto; é porque ele vos engana e tornou-se vosso
tirano." Dizendo estas palavras, ele e os de seu partido fizeram menção de
me matar. Mas os que tinham vindo comigo, sacaram das espadas, e o povo pegou
em pedras para atacar Jônatas e tiraram-me das mãos dos meus inimigos. Quando
me retirava, vi chegar João com os seus; alcancei o lago por um caminho
escondido, subi a uma barca e salvei-me, dirigindo-me para Tariquéia, escapando
assim de um grave perigo.
Reuni imediatamente os principais da Galiléia e disse-lhes
de como, contra toda espécie de justiça, pouco faltara que Jônatas e os de seu
partido não me tivessem assassinado. Eles ficaram tão irritados, que me rogaram
não demorasse mais em levá-los contra eles e permitisse que exterminassem a
João, a Jônatas e a todos os colegas. Eu os retive, dizendo que antes de pegar
em armas, era preciso esperar a volta daqueles que havia mandado a Jerusalém, a
fim de nada se fazer sem o seu consentimento. No entanto, João, vendo que seu
plano havia falhado, voltara a Giscala.
Pouco tempo depois, os que havia mandado a Jerusalém
voltaram e me disseram que o povo tinha achado muito mal que o sumo sacerdote
Anano e Simão, filho de Gamaliel, tivessem, sem sua participação, mandado
deputados à Galiléia para me destituir do cargo e que pouco faltara para que
eles incendiassem as casas. Entregaram-me também as cartas pelas quais os
principais da cidade, com a autoridade e o consentimento do povo,
confirmavam-me no governo e ordenavam a Jônatas e aos seus colegas que
voltassem. Depois que recebi estas cartas, fui a Arbella, onde havia mandado
que se reunissem, e lá meus enviados me contaram de que modo o povo de
Jerusalém, irritado com a maldade de Jônatas, me havia mantido no cargo e lhe
havia ordenado que se retirasse com seus colegas. Mandei em seguida a estes
quatro deputados as cartas que lhes seriam dirigidas, e ordenei ao que disso
fora encarregado, que observasse a atitude deles. Eles ficaram terrivelmente
perturbados e mandaram logo chamar a João. Reuniram-se, em seguida, com o
Senado de Tiberíades e os principais de Gabara, a fim de deliberar sobre o que
haveriam de fazer. Os de Tiberíades foram de opinião que Jônatas e seus colegas
deviam continuar a se ocupar do governo, para não abandonar uma cidade que se
havia entregado às suas mãos, e isso tanto mais porque eu tinha me resolvido a
atacá-los, o que eles afirmavam falsamente. João aprovou esse parecer e
acrescentou que era necessário mandar dois dos deputados a Jerusalém para me
acusarem diante do povo de ter governado mal a Galiléia. Que seria muito fácil
persuadi-lo disso, quer pela consideração de sua qualidade, quer pela
leviandade que lhe é tão natural.
Todos aprovaram esta proposta. Jônatas e Ananias partiram
imediatamente; seus dois colegas ficaram em Tiberíades, onde lhes deram cem
homens para sua guarda. Os habitantes puseram-se em seguida a trabalhar na
reparação das muralhas, tomaram as armas e mandaram pedir tropas a João, em
Giscala, para se servirem delas, em caso de necessidade, contra mim.
Jônatas e os que o acompanhavam chegaram a Darabite, pequena
aldeia situada no Campo Grande, nas fronteiras da Galiléia; os meus homens,
postados nas estradas, prenderam-nos, obrigaram-nos a deixar as armas e os
conservaram prisioneiros, naquele mesmo lugar. Levi, que comandava esses
homens, escreveu-me logo, narrando tudo. Eu dissimulei-o durante dois dias, e
mandei dizer aos de Tiberíades que deixassem as armas e que fizessem voltar
para sua cidade os que eles haviam mandado vir em seu socorro. Na persuasão e
na esperança de que Jônatas já tinha chegado a Jerusalém, eles só me
responderam com injúrias. Julguei, no entanto, dever continuar a agir, mais
pela astúcia do que pela força, a fim de não me tornar culpado de ter ateado
uma guerra civil.
Assim, para atraí-los para fora dos muros, tomei dez mil
homens escolhidos e os dividi em três corpos. Ordenei a uma parte que ficasse
na aldeia de Domez; coloquei mil numa vilazinha que está na montanha, longe
quatro estádios de Tiberíades, com ordem de só partir depois que eu lhes
houvesse dado o sinal, e avancei, com um outro corpo, à vista de Tiberíades. Os
habitantes saíram, fizeram várias incursões contra meus soldados e empregaram
palavras ofensivas contra mim. Sua imprudência foi mesmo tão longe que eles
mandaram buscar um esquife e fingiam, por zombaria, chorar a minha morte. Eu,
porém, em meu coração, zombava de sua loucura. Como eu tinha ainda a intenção
de me apoderar de João e de Joasar, os outros dois colegas de Jônatas, que
tinham ficado em Tiberíades, eu lhes disse que avançassem para fora da cidade,
com seus amigos e guardas que quisessem escolher para sua segurança, porque eu
desejava conversar com eles sobre os meios de entrar em algum acordo para
dividir o governo da Galiléia. Simão, animado por uma proposta tão vantajosa,
foi tão incauto que aceitou; Joasar, ao contrário, desconfiando de que haveria
aí alguma intenção falsa não caiu na cilada. Eu fiz grandes reverências a Simão
e aos amigos, por terem vindo; e tendo-o afastado pouco a pouco de seus homens,
com o pretexto de lhe dizer alguma coisa em segredo, agarrei-o, e o entreguei
aos meus, que o levassem àquela aldeia onde eu tinha soldados escondidos. Dei-lhes
depois o sinal e marchei para Tiberíades. Começou então o combate. Foi muito
renhido. Os meus estiveram a ponto de fugir, se eu não lhes houvesse dado mais
coragem. Finalmente, depois de termos corrido o risco de uma derrota, obriguei
os inimigos a voltar para a cidade.
No entanto, alguns daqueles que eu havia enviado pelo lago,
com ordem de incendiar a primeira casa que tomassem, executaram essa ordem, e
os habitantes imaginaram que a cidade havia sido tomada de assalto, depuseram
as armas e rogaram-me, com suas mulheres e filhos, que os perdoasse. Eu o fiz,
e detive o furor dos soldados. A noite chegava rapidamente; mandei então tocar
a retirada e fiz trazer Simão para jantar comigo, consolei-o e prometi dar-lhe
liberdade e levá-lo em segurança até Jerusalém, com tudo o de que ele teria
necessidade para a viagem.
Entrei no dia seguinte com dez mil homens armados em
Tiberíades e mandei vir à praça os principais da cidade, aos quais ordenei que
declarassem quais haviam sido os autores da revolta. Eles o fizeram e eu os
mandei manietados a Jotapate. Quanto a Jônatas e aos seus colegas, mandei
levá-los com uma escolta a Jerusalém, provendo tudo o que era necessário para
sua viagem. Os habitantes de Tiberíades vieram uma segunda vez rogar-me que
esquecesse os motivos que tinha de me queixar deles, garantindo-me que
reparariam, pela fidelidade, às faltas cometidas no passado, rogando-me que
mandasse restituir o que havia sido roubado. Ordenei logo que trouxessem à
grande praça tudo o que tinha sido tomado. Como os soldados sentiam dificuldade
em se decidir a isso, eu lancei os olhos sobre um deles, que estava muito mais
bem vestido do que de costume e perguntei-lhe onde havia adquirido aquela
veste; ele confessou que a havia roubado. Ordenei que o espancassem e ameacei
tratar os outros ainda mais severamente se não restituíssem tudo o que haviam
pilhado. Obedeceram, então, e eu mandei restituir a cada um dos habitantes o
que lhe pertencia.
Creio dever informar neste ponto a má fé de justo e dos
outros que, tendo falado deste mesmo assunto nas suas histórias, não tiveram
receio, para satisfazer à própria paixão e ódio, de expor aos olhos da
posteridade os fatos de uma maneira bem diferente da que na verdade eles se
passaram. Em nada eles diferem dos que falsificam os atos públicos, senão
nisto, que tendo resolvido tornar-se ilustre, escrevendo esta guerra, disse de
mim muitas coisas falsas e não foi mais verdadeiro no que se refere ao seu
próprio país. E o que me obriga agora, para desmenti-lo, a relatar o que havia calado
até aqui, e não nos devemos admirar por ter diferido tanto, pois, ainda que um
historiador seja obrigado a dizer a verdade, ele pode não se deixar levar
contra os maus; não que eles mereçam ser favorecidos, mas para permanecermos
nos termos de uma sábia moderação. Assim, Justo, que pretendeis ser o
historiador a quem mais se deve prestar fé, dizei-me, rogo-vos, como é possível
que os galileus e eu tenhamos sido causa da revolta do vosso país contra os
romanos e contra o rei, pois que antes que a cidade de Jerusalém me tivesse
mandado como governador à Galiléia, vós e os de Tiberíades tínheis já tomado as
armas e feito guerra aos da província de Decápolis, na Síria? Podeis negar que
não incendiastes suas aldeias e que um dos vossos lá não foi morto, do que eu
não sou o único a testemunhar, porque tudo isso se encontra mesmo nos
comentários do imperador Vespasiano, onde se vê que quando ele estava em
Ptolemaida, os habitantes de Decápolis rogaram-no que vos castigasse como autor
de todos os seus males e ele o teria feito, sem dúvida, se o rei Agripa, a quem
fostes entregue para que se fizesse justiça, não vos tivesse perdoado a rogo da
sua irmã Berenice, o que não impediu que ficásseis por muito tempo na prisão?
Mas as vossas outras ações fizeram também claramente
conhecer qual tínheis sido durante toda a vossa vida e que fostes vós que
levastes vosso país a se revoltar contra os romanos, como eu o farei ver com
provas assaz convincentes. Acho-me agora obrigado, por vossa causa, a acusar os
outros habitantes de Tiberíades e a mostrar que vós não fostes fiéis nem ao rei
nem aos romanos. Séforis e Tiberíades, de onde sois originários, são as maiores
cidades da Galiléia. A primeira, que está situada no meio do país e que tem em
redor de si várias aldeias que dela dependem, resolveu permanecer fiel aos
romanos, embora pudesse facilmente ter se revoltado contra eles, jamais me quis
receber, nem tomar as armas pelos judeus. Mas no temor que seus habitantes
tinham de mim, eles me surpreenderam com seus artifícios e me levaram mesmo a
construir-lhes muralhas. Receberam depois, de boa mente, a guamição de Céstio
Galo, governador da Síria, pelos romanos e me recusaram a entrada em sua
cidade, porque nem mesmo nos ajudar durante o cerco de Jerusalém, embora o
Templo que lhes era comum conosco estivesse em perigo de cair nas mãos dos
inimigos, tanto eles temiam parecer tomar as armas contra os romanos.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
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História De Israel – Teologia 31.279 (2º Parte Livro 0.2) Vida de Flávio Josefo Escrita por Ele mesmo Parte 3
História De Israel – Teologia 31.279
Vida de Flávio Josefo
Escrita por Ele mesmo Parte 3
cessou o tumulto, e voltei a Tariquéia. Os de Tiberíades não
se cansavam de admirar de como eu havia acalmado aquela revolta, sem
derramamento de sangue.
Depois que cheguei a Tariquéia, mandei meus prisioneiros
virem cear comigo, dentre os quais estavam Justo e Pisto, seu pai, e disse-lhes
que sabia, como eles, qual era o poder dos romanos; mas que o grande número de
facciosos impedia-me de manifestar meus sentimentos e aconselhava-os a
permanecer como eu, no silêncio, esperando um tempo melhor. No entanto, eles
deveriam se considerar mui felizes por ter-me por governador, pois nenhum outro
poderia tratá-los melhor. Lembrei a justo, a esse respeito, que antes da minha
vinda, os galileus tinham mandado cortar as mãos ao seu irmão, acusando-o de
ter escrito falsas cartas; que depois da partida de Filipe, os gamalitanos,
numa contestação que tiveram com os babilônios, tinham matado Cares, parente de
Filipe, ao passo que eu tinha feito sofrer um castigo muito leve a Jesus, seu
irmão, que tinha desposado a irmã de Justo. Depois disso, pus em liberdade a
Justo e a todos os seus.
Pouco antes, Filipe, filho de Jacim, tinha partido do
castelo de Gamala, pela razão que passo a expor: Logo que ele soube que Varo se
tinha revoltado contra o rei Agripa e que Equo Módio, que era muito seu amigo,
lhe fora dado como sucessor, escreveu a este último para avisá-lo do estado em
que se achava e rogar-lhe que entregasse ao rei e à rainha as cartas que lhes
escrevia. Módio soube com muita alegria o que Filipe lhe dizia, e mandou as
cartas ao soberano e à princesa. O rei soube então da falsidade do que se havia
dito, de Filipe se ter tornado chefe dos judeus, para fazer guerra aos romanos;
mandou buscá-lo com uma escolta de cavalaria e o recebeu muito bem. Mostrava-o
mesmo aos capi-tães romanos, dizendo-lhes: "Eis aquele que acusavam de se
ter revoltado contra vós." Mandou-o depois com a cavalaria ao castelo de
Gamala, para reunir todos os seus homens, restabelecer os babilônios em
Batanéia e consolidar a tranqüilidade pública; Filipe partiu com essas ordens.
No entanto, um certo José, que queria passar por médico, mas que era apenas um
charlatão, reuniu os mais ousados da juventude de Gamala e atraiu também para
si os maiorais da cidade; assim persuadiu o povo a sacudir o jugo do rei e a
tomar as armas para reconquistar a liberdade. Obrigou outros, contra a vontade,
a entrar no seu partido, mandando matar os que se recusavam, dentre os quais
estavam Cares Jesus, seu parente, e a irmã de Justo, que era de Tiberíades. Ele
me escreveu em seguida para me pedir auxílio e operários para construir as
muralhas da cidade, o que julguei conveniente conceder-lhe.
Nesse mesmo tempo, a parte da Galautida que se estende até a
aldeia de Solima revoltou-se também contra o rei. Mandei rodear de muros Sogan
e Selêucia, que são duas praças fortes e bem situadas, fortifiquei Jamnia,
Amerite e Charabe, três aldeias da alta Galiléia, embora com dificuldade, por
causa dos rochedos que lá existem, e dei ordem, principalmente, para fortificar
Tariquéia, Tiberíades e Séforis. Mandei também rodear de muralhas algumas
aldeias, como Bersobé, Seelamem, Jotapate, Cafarate, Comosgana, Nepafa, o monte
Itaburim, e a caverna dos arbelianos; ali mandei reunir grande quantidade de
trigo, e dei-lhes armas para se defenderem.
No entanto, João, filho de Levi, cuja raiva aumentava cada
vez mais, não podendo tolerar minha prosperidade, resolveu prejudicar-me a todo
custo. Assim, depois de ter feito cercar de muralhas Giscala, que era o lugar
do seu nascimento, mandou Simão, seu irmão, e Jônatas, filho de Sisena, acompanhado
por cem soldados, a Simão, filho de Gamaliel, para rogar-lhe que tudo fizesse
perante os de Jerusalém para revogar o poder que me tinha sido dado e que ele
fosse feito governador em meu lugar, com o consentimento unânime de todo o
povo. Simão, de Jerusalém, era de mui ilustre descendência, da seita dos
fariseus e, conseqüentemente, observante das nossas leis, homem muito sábio e
muito prudente, capaz de realizar grandes empreendimentos, antigo amigo de
João, e que, então, me odiava. Assim, levado pelos rogos insistentes de seus
amigos, ele disse aos sumos sacerdotes Anano e Jesus, filho de Gamala, e aos
outros que eram do seu partido, que era necessário tirar-me o governo da
Caliléia antes que eu fosse elevado a um poder maior e que não havia tempo a perder,
porque se eu viesse a saber de tudo, poderia atacar a cidade com um exército.
Anano respondeu-lhe que o que ele propunha não era fácil de
se executar, porque vários sacerdotes e alguns dos grandes do povo davam
testemunhos muito vantajosos a meu respeito e, assim, não era razoável acusar
um homem a quem nada se podia censurar. Simão rogou-lhe que, pelo menos,
conservassem as coisas em segredo e disse que ele se encarregava da sua
execução. Fez vir depois o irmão de João e o encarregou de lhe dizer, que, para
chegar ao fim do seu projeto, mandasse presentes a Anano. Este expediente deu
resultado; porque Anano e os outros deixaram-se subornar pelo dinheiro, e
resolveram tirar-me o governo, sem que ninguém mais de Jerusalém, a não ser os
do seu partido, viessem a sabê-lo. Para esse fim, mandaram quatro pessoas que,
embora de diversas famílias e descendências, eram sensatas e hábeis; a saber,
dentre o povo, Jônatas e Ananias, fariseus, e da casta sacerdotal, Gozor,
também fariseu, aos quais se uniu Simão, o mais jovem de todos, descendente dos
sumo sacerdotes . A ordem que deram foi de reunir os galileus e de lhes
perguntar de onde vinha aquele grande afeto que sentiam por mim: se eles
dissessem que era porque eu era de Jerusalém, eles lhes respondessem que todos
os quatro eram-no também; se eles dissessem que era porque eu era mui perito
nas leis, eles lhes respondessem que eles eram não menos instruídos do que eu;
e se dissessem que era porque eu era sacerdote, eles replicassem que dois
dentre eles eram-no também.
Jônatas e seus colegas partiram com essas instruções e com
quarenta mil moedas de prata, que lhes foram dadas do tesouro público. Um certo
Jesus, da Galiléia, nesse mesmo tempo veio a Jerusalém, com seiscentos homens,
que ele comandava; pagaram-no por três meses e a todos seus soldados e os
induziram a segui-los, para fazer tudo o que eles lhes mandassem; uniram-se
ainda a eles, trezentos habitantes de Jerusalém, aos quais pagaram também.
Assim partiram, levando com eles a Simão, irmão de João e os cem soldados que
haviam trazido. Tinham além disso uma ordem secreta de me levar a Jerusalém, se
eu deixasse de boa mente as armas, e de matar-me, se eu oferecesse resistência,
sem temor de serem castigados, pois faziam-no em virtude do seu poder. Tinham
também cartas dirigidas a João, exortando-o a fazer-me guerra e outras, aos
habitantes de Séforis, de Gabara e de Tiberíades, para induzi-los a lhe dar
auxílio. Jesus, filho de Gamala, que tivera parte em todos esses conselhos, e
que era muito meu amigo, avisou a meu pai, que me escreveu longamente. A inveja
de meus concidadãos tinha, por uma tão grande ingratidão, conspirado contra mim
e deliberado matar-me, mas eu estava ainda mais aflito pela insistência com que
meu pai pedia que fosse vê-lo, a fim de lhe dar, antes de morrer, a consolação
de me abraçar ainda.
Comuniquei todas essas coisas a meus amigos e disse-lhes que
estava resolvido a partir dentro de três dias. Rogaram-me com lágrimas, a não
expô-los, por meu afastamento, a uma ruína inevitável. Mas não podia
resolver-me a atendê-los, porque eu mesmo estava ainda mais aflito do que eles.
Nesse mesmo tempo os galileus, temendo que minha ausência os expusesse à
violência daqueles desordeiros, que devastavam continuamente os campos,
comunicaram a toda a Galiléia a intenção que eu tinha de ir embora.
Imediatamente eles vieram, de todos os lados, procurar-me na aldeia de Azoquim,
no Campo Grande, com suas mulheres e filhos, não tanto, segundo minha opinião,
pelo afeto que me tinham, mas pelo seu próprio interesse, porque julgavam nada
ter a temer enquanto eu estivesse com eles.
Tive então durante a noite um sonho esquisito. Adormeci com
grande tristeza no coração, por causa das cartas recebidas; parecia-me ver um
homem que me dizia: "Consolai-vos e não temais; a tristeza em que vos
encontrais será causa da vossa felicidade e de vossa elevação e não somente
saireis com vantagem deste perigo, mas também de vários outros. Não vos
deixeis, pois, abater. Coragem! Lembrai-vos do aviso que vos dou, de que vos
será necessário fazer a guerra que vos dou, de que vos será necessário fazer a
guerra aos romanos". Levantei-me em seguida, para sair do meu aposento;
mas aquela multidão de galileus, homens, mulheres e crianças, apenas me viram,
lançou-se de rosto por terra, ro-gando-me com lágrimas nos olhos, que não os
abandonasse e não deixasse seu país à mercê dos inimigos; como eles viam que eu
não me deixava comover por seus rogos, faziam mil imprecações contra os de
Jerusalém, os quais não podiam tolerar que eles vivessem em paz sob meu
governo. Tão grande aflição de todo o povo tocou-me o coração. Julguei que não
havia perigo ao qual não me devesse expor, para sua salvação; e assim,
prometi-lhes ficar. Mandei que escolhessem cinco mil homens com armas e
munições de boca para me seguirem e despedi todos os outros. Marchei com esses
cinco mil homens, três mil soldados, que eu já tinha e oitenta cavaleiros para
uma aldeia na fronteira de Ptolemaida, de nome Chabolom, para enfrentar a
Plácido, que Céstio Galo tinha mandado com infantaria e uma companhia de
cavalaria para incendiar as aldeias dos galileus, que estão nos arredores de
Ptolemaida. Ele acampou e fortificou-se perto da cidade e eu fiz a mesma coisa
a sessenta estádios de Chabolom. Assim, estando muito próximos uns dos outros,
saíamos freqüentemente de nossas fortificações, como para travar combate, mas
aconteciam apenas ligeiras escaramuças, porque quanto mais Plácido via que eu
desejava travar batalha, mais ele temia empreender uma grande luta e não quis
afastar-se de Ptolemaida.
Estando as coisas nesse pé, Jônatas e seus colegas chegaram
à província; como não ousavam atacar-me abertamente, procuraram surpreender-me
e para isso escreveram uma carta cujas palavras eram estas:
"Jônatas e seus colegas, enviados pelos de Jerusalém, a
Josefo, saudação. Os mais da cidade de Jerusalém, tendo sabido que João, de
Giscala, vos armou diversas ciladas, mandaram-nos para fazer-lhe severas
recriminações e ordenar-lhe que obedeça exatamente, para o futuro, em tudo o
que lhe determinardes mas, porque nós desejamos conversar convosco, para prover
com a vossa opinião, a todas as coisas, nós vos rogamos vir prontamente ter
conosco, sem grande acom-panhamento, porque esta aldeia é muito pequena para
alojar um grande número de soldados."
Esta carta fazia-os esperar que, se eu os fosse encontrar,
desarmado, eles poderiam sem dificuldade prender-me, ou, se eu fosse com
soldados, far-me-iam declarar rebelde. Um jovem cavaleiro, muito corajoso e que
outrora tinha servido ao rei, foi encarregado de trazer esta carta; chegou na
segunda hora da noite, quando eu estava à mesa com meus amigos mais íntimos e
os mais ilustres dos galileus. Um dos meus homens veio dizer-me que um
cavaleiro judeu tinha chegado e eu ordenei que o fizesse entrar. Ele não
cumprimentou a ninguém e disse somente, entregando-me a carta: "Eis o que
vos escrevem os enviados de Jerusa-lém; dai-lhes a resposta com urgência, pois
eu tenho de voltar imediatamente." Os que estavam à mesa comigo admiraram
a insolência do soldado, mas eu roguei-lhe que se sentasse e ceasse conosco.
Ele recusou-o. Então, tendo sempre a carta na mão, sem abri-la, continuei a
conversar com meus amigos sobre diversas coisas. Algum tempo depois, dei-lhes a
boa noite, conservando somente quatro dos que mais mereciam minha confiança, e
mandei que trouxessem vinho. Sem que ninguém percebesse, abri a carta; tendo
visto o que ela continha, tornei a dobrá-la, conservando-a sempre na mão, como
se não a tivesse aberto. Ordenei em seguida que dessem àquele soldado vinte
dracmas para as despesas de sua viagem. Ele as recebeu e agradeceu. Isso fez-me
ver que ele gostava de dinheiro e que assim não me seria difícil suborná-lo;
então, eu lhe disse: "Se quer beber conosco, dar-lhe-ei uma dracma, cada
copo de vinho que beber." Ele aceitou a condição e bebeu tanto, para
ganhar muito, que ficou embriagado. Não lhe sendo mais possível guardar
segredo, não foi preciso interrogá-lo para fazê-lo afirmar que me haviam armado
ciladas e que eu tinha sido condenado a morrer. Estando assim informado do
projeto daqueles que o haviam mandado, eu lhes respondi deste modo:
"Josefo, a Jônatas e aos seus colegas, saudação. Tenho
tanto mais alegria em saber que chegastes bem à Galiléia, quanto me é assim
fácil entregar em vossas mãos o cuidado dos interesses desta província e
satisfazer ao desejo que sinto, há muito tempo, de voltar a Jerusalém. Assim,
iria procurar-vos em Xalom e muito mais longe, quando mesmo não me tivésseis
convidado para isso. Mas, haveis de me perdoar se não posso fazê-lo agora,
porque sou obrigado a ficar em Chabolom, para vigiar Plácido e impedir que ele
faça uma incursão na Galiléia. É, portanto, muito mais conveniente que venhais
aqui depois de terdes recebido minha resposta, como vos peço."
Entreguei esta carta ao soldado e mandei com ele trinta
pessoas, das mais importantes da Galiléia, com ordem de saudar somente os
enviados, sem lhes falar de assunto algum; dei a cada um, para acompanhá-los,
um dos meus soldados nos quais mais eu confiava, aos quais ordenei que observassem
cuidadosamente, se aqueles gentis-homens galileus falariam com jônatas. Os
enviados de Jerusalém, vendo-se assim ludibriados na sua expectativa,
escreveram-me outra carta, cujas palavras são estas:
"Jônatas e seus colegas a Josefo, saudação. Ordenamos-vos
que venhais dentro de três dias encontrar-vos conosco em Gabara, sem
acompanhamento de soldados, a fim de que tomemos conhecimento dos crimes de que
acusastes a João."
Depois de ter recebido os gentis-homens galileus e de ter-me
escrito aquela carta, eles vieram a Jafa, a maior aldeia do país, melhor
rodeada de muralhas e muito populosa. Todos os habitantes compareceram à sua
presença, com as mulheres e filhos, pedindo que se retirassem, sem invejar a
felicidade de que gozavam, por ter um governador tão bom e honesto. Jônatas e
seus colegas, embora muito irritados com essas palavras, não ousaram
manifestá-lo, nem lhes responderam. Dirigiram-se a outras aldeias, onde foram
recebidos do mesmo modo; todos clamavam que queriam a Josefo, como governador.
Assim, nada podendo fazer, foram a Séforis. Seus habitantes são amigos dos
romanos, e contentaram-se em comparecer à sua presença, mas não falaram de mim
de modo algum. De lá passaram a Azoquim, onde foram recebidos como em jafa e,
então, não podendo mais conter a cólera, ordenaram aos soldados que os
acompanhavam que fizessem aquela gente calar-se e os dispersassem a cacetadas.
Prosseguiram para Gabara, onde João veio encontrá-los, com três mil soldados.
Como eu havia sabido pelas cartas, que eles estavam resolvidos a me matar,
tomei três mil dos meus soldados, deixei o restante no acampamento, sob o
comando de um de meus amigos, no qual depositava inteira confiança, e fui para
Jotapate, para ficar perto deles, pois de lá dista apenas quarenta estádios.
Escrevi então aos enviados desta maneira:
"Se quereis absolutamente que eu vá ter convosco, há na
Galiléia duzentas e quatro aldeias ou vilas; eu irei à qualquer uma delas, como
vos aprouver, exceto Gabara e Giscala, pois uma é a terra de João e a outra tem
uma ligação muito particular com ele." Jônatas e seus colegas não me
escreveram mais, depois de ter recebido esta carta, mas reuniram-se em conselho
com os amigos de João, para deliberar sobre os meios de me atacar. João propôs
escrever a todas as cidades, aldeias e vilas da Galiléia, dizendo que, em cada
uma delas se encontravam pelo menos duas pessoas que não me estimavam; que as
fariam comparecer à sua presença, para depor contra mim; que se faria um
documento com suas declarações para provaros galileus me haviam declarado
inimigo e se enviaria esse documento a Jerusalém, para lá ser confirmado; isso
causaria temor aos galileus, que me estimavam e os levaria a me abandonar. Essa
proposta foi logo aprovada e mais ou menos pela terceira hora da noite, Sacheu
veio trazer-me essa notícia.
Vendo então que não havia tempo a perder, ordenei a Jacó,
que me era mui fiel, que tomasse duzentos homens e os colocasse nas estradas
que vão de Gabara à Galiléia, para deter todos os viandantes e mandá-los a mim,
principalmente os que fossem encontrados com cartas. Depois ordenei aos
galileus, que no dia seguinte se encontrassem armados em Gabara, com víveres
para três dias; separei em quatro grupos os soldados que restavam, dando-lhes
como comandantes os meus oficiais nos quais tinha absoluta confiança,
proibindo-lhes receber entre eles qualquer soldado desconhecido. No dia
seguinte, quando cheguei a Gabara, pela quinta hora do dia, encontrei os campos
cheios de galileus armados, que vinham em meu auxílio e com eles uma grande
quantidade de camponeses. Comecei a falar-lhes e eles aclamaram a uma voz que
eu era seu benfeitor e o salvador de seu país. Agradeci-lhes o afeto e
exortei-os a não fazer mal a ninguém; e a se contentar com os víveres que
tinham trazido sem nada tirar das aldeias, porque eu desejava acalmar aquela
sedição, sem derramamento de sangue e sem violência.
Naquele mesmo dia, os que levavam a Jerusalém as cartas de
Jônatas caíram nas mãos dos homens que eu havia colocado nas estradas.
Fizeram-nos prisioneiros, mandaram-me as cartas que encontrei cheias de
calúnias e de injúrias contra mim. Dissimulei, não falei com ninguém, mas
resolvi ir diretamente a eles. Logo que souberam que eu me aproximava,
retiraram-se, e João com eles, para a casa de Jesus, que era uma torre grande e
forte, pouco diferente de uma fortaleza. Lá ocultaram uma companhia de
soldados, fecharam todas as portas, exceto uma e aguardaram-me, na esperança de
que eu os iria saudar. Haviam ordenado aos seus soldados que me deixassem
entrar, a mim, sozinho, e afastassem a todos os outros, julgando que assim
ser-lhes-ia fácil prender-me. Mas essa traição não deu resultado, porque eu me
conservava sempre de sobreaviso e por isso entrei numa casa perto da deles e
fingi ter necessidade de descansar. Eles julgaram que eu estava adormecido na
verdade e saíram para induzir minhas tropas a me aban-donar alegando que
desempenhara muito mal o meu cargo. No entanto, aconteceu justamente o
contrário. Apenas os galileus os viram, começaram a dar logo demonstrações do
afeto que nutriam por mim e censuraram-nos, porque, sem que eu lhes tivesse
dado o mínimo motivo, vinham perturbar a tranqüilidade da província; a isso
acrescentaram que eles podiam regressar, pois não receberiam outro governador.
Isso me foi referido e eu aproximei-me para ouvir o que Jônatas dizia. Todo o
povo recebeu-me com aclamações de alegria e com agradecimentos por tê-los
governado com tanta justiça e bondade. Jônatas e os colegas, ouvindo-os falar
daquele modo, perceberam não ter a vida muito segura e pensaram em fugir. Mas
isso não estava mais em seu poder. Eu lhes disse que ficas-sem e eles estavam
tão assustados, que pareciam fora de si.
Depois de ter imposto silêncio a todo aquele povo, ordenei
aos meus soldados, de mais confiança, que vigiassem as estradas e determinei
que todos os outros se conservassem armados, para impedir qualquer surpresa de
João ou de nossos outros inimigos. Comecei por falar-lhes da primeira carta que
aqueles enviados me tinham escrito, pela qual me diziam que eram mandados de
Jerusalém para solucionar as divergências entre João e mim e me rogavam que os
fosse procurar. Para que ninguém pudesse duvidar, apresentei a carta e
acrescentei, dirigindo minha palavra a Jônatas: "Se, achando-me obrigado a
me justificar diante de vós e de vossos colegas, das acusações de João contra
mim, eu tivesse trazido duas ou três testemunhas honestas, que prestassem fé à
sinceridade de minhas ações, não é verdade que vós não poderíeis não me
absolver? Mas agora, para dizer-vos de que modo tenho procedido
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
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13 de julho de 2018
História De Israel – Teologia 31.278 (2º Parte Livro 0.2) Vida de Flávio Josefo Escrita por Ele mesmo Parte 2
História De Israel – Teologia 31.278
Vida de Flávio Josefo
Escrita por Ele mesmo Parte 2
aumentaram ainda mais a inveja de João. Ele escreveu-me
pedindo permissão para ir a Tiberíades tomar banhos quentes, de que estava
necessitando para sua saúde. Como não imaginava que ele tinha má intenção, não
somente lho permiti, mas ordenei aos magistrados que lhe preparassem um
aposento, a ele e aos seus companheiros, e lhes fornecessem em abundância tudo
o que lhes fosse necessário. Eu estava então em Canaã, cidadezinha da Galileia;
apenas João chegou a Tiberíades, procurou logo induzir os habitantes a
faltar-me à fidelidade e a se separarem de mim, para passar ao seu partido.
Vários dentre eles, propensos à revolução, escutaram com prazer essa proposta,
principalmente Justo e Pisto, seu pai; mas eu tornei inútil o seu mau intento. Silas,
que eu havia dado por governador aos de Tiberíades, man-dou com grande rapidez
avisar-me do que se passava e insistiu que eu me apressasse, se não quisesse,
pela minha demora, deixar cair aquela cidade em poder de outro. Tomei
imediatamente duzentos homens, caminhei durante toda a noite e mandei avisar os
de Tibenades acerca de minha chegada.
No dia seguinte, ao raiar da aurora, eu estava perto da
cidade; os habitantes vieram ter comigo, e João com eles; cumprimentou-me com o
rosto espantado e temendo que o mandasse matar, se viesse a saber da sua
perfídia, retirou-se para o seu aposento. Chegando à praça dos exercícios,
conservei comigo apenas um homem e dez soldados. Subi a um lugar elevado e
disse ao povo quanto lhe era necessário manter a fidelidade, pois do contrário
eu não poderia mais confiar nele, e que se arrependeriam um dia de ter faltado
ao seu dever. Enquanto falava, um dos meus amigos avisou-me que me retirasse,
pois não era aquele o tempo mais apropriado para granjear a benevolência do povo,
mas para me salvar de suas mãos, pois João tendo sabido que eu estava quase
sozinho, tinha escolhido, entre os mil homens que comandava, aqueles em quem
mais confiava e os mandara com ordem de me matar.
Com efeito, aqueles assassinos já estavam perto e teriam
executado seu perverso intento, se eu não me tivesse afastado prontamente, com
o auxílio de um dos meus guardas, de nome Jacó, e de um homem de Tiberíades,
chamado Herodes, que me fizeram descer e me acompanharam até o lago. Ali, por
felicidade, encontrei uma barca que me levou a Tariquéia; assim, pude frustrar
as esperanças dos meus inimigos. Os habitantes da cidade sentiram tanto horror
pela traição dos de Tiberíades que tomaram logo as armas e insistiram comigo
que os levasse contra eles, para se vingar de tal perfídia, e mandaram contar a
toda a Galiléia tudo o que se tinha passado, convidando todos a se juntarem a
eles e a marcharem sob meu comando. Esses povos reuniram-se em grande número
junto de mim e todos me rogaram que fosse atacar Tiberíades, que a destruísse
inteiramente, vendesse em leilão todos os homens, as mulheres e as crianças;
meus amigos, que haviam escapado do mesmo perigo, aconselhavam-me a mesma
coisa. Mas o medo de atear uma guerra civil impediu-me que tomasse tal decisão.
Julguei que era melhor acomodar a situação e lhes mostrei o mal que fariam a si
mesmos, se quando os romanos viessem, os encontrassem divididos, a matarem-se
uns aos outros.
Assim acalmei-lhes a cólera, e João, vendo que sua traição
lhe havia saído tão mal, fugiu assustado de Tiberíades com seus homens para se
refugiar em Ciscala. Ele me escreveu que não tivera participação no que havia
acontecido, e fazia juramentos e estranhas execrações para me levar a acreditar
em suas palavras. No entanto, um grande número de galileus veio ter comigo
armados, e como sabiam que João era mau e perjuro, rogavam-me insistentemente
que os levasse contra ele, para derrotá-lo e castigá-lo, e exterminar os de
Giscala. Eu lhes agradeci muito aquela demonstração de boa vontade e garanti
que conservaria sempre grande gratidão, mas rogava que aprovassem o meu desejo
de pacificar aquela perturbação, sem derramamento de sangue. Consegui
persuadi-los e em seguida fomos a Séforis. Seus habitantes, que temiam minha
vinda, porque estavam resolvidos a permanecer fiéis e obedientes aos romanos,
procuraram levar-me a outra parte e para isso pediram a Jesus, com oitocentos
ladrões, comandados por ele, que estavam então na fronteira de Ptolemaida, para
fazer-me guerra, a troco de grande soma de dinheiro.
Tal recompensa fê-lo aceitar a proposta, mas antes de
chegarmos às armas abertamente, ele procurou surpreender-me. Mandou dizer-me
que lhe permitisse vir cumprimentar-me. Permiti-lho, porque não desconfiava de
nada; ele se pôs em seguida a caminho, com todos os seus homens. Sua maldade,
no entanto, não teve o êxito que ele esperava. Quando já estava muito perto de
nós, um do seu bando veio avisar-me do seu intento. Então, sem dar demonstração
alguma, fui à praça pública, acompanhado de grande número de galileus armados,
entre os quais havia alguns de Tiberíades; ordenei que vigiassem todas as ruas
e encarreguei aos que estavam nas portas, que não deixassem Jesus entrar, senão
com um pequeno número e afastassem os outros; até mesmo os repelissem, à força,
se eles teimassem em querer entrar. Jesus veio, então, com apenas alguns homens
e eu lhe ordenei que deixasse as armas, se não quisesse perder a vida; quando
se viu rodeado de soldados, foi obrigado a obedecer. Os seus, que tinham ficado
do lado de fora, quando souberam que ele estava preso, fugiram. Levei-o à parte
e disse-lhe que não ignorava qual era seu intento, nem sabia quem eram seus
cúmplices, mas que lhe perdoaria, se ele me prometesse ser fiel para o futuro.
Ele me prometeu e o deixei sair, permitido-lhe reorganizar suas tropas. Quanto
aos seforitanos, declarei-lhes que, se não continuassem a obedecer, saberia
muito bem como castigá-los.
Nesse mesmo tempo, dois senhores traconitidas, súditos do
rei, vieram me procurar, armados, com cavalos e dinheiro. Os judeus não lhes
queriam permitir permanecer com eles, se não se fizessem circuncidar; mas eu
lhes disse que se devia deixar a cada qual a liberdade de servir a Deus segundo
os movimentos da própria consciência, sem usar de coação, nem dar motivo, aos
que vinham pro-curar sua segurança entre nós, de se arrepender. Assim fiz o
povo mudar de sentimentos e levei-o a dar a esses estrangeiros as coisas de que
eles tinham necessidade.
O rei Agripa mandou, nesse mesmo tempo, Equo Módio, com
grande número de soldados, para tomar o castelo de Magdala; mas ele não ousou
sitiá-lo e se contentou em perturbar Gamala, pondo soldados nas ruas. No
entanto, Ebúcio, outrora governador do Campo Grande, soube que eu estava em
Simoniada, na fronteira da Galiléia, a sessenta estádios dele. Marchou a noite
toda, para vir atacar-me com cem cavaleiros, duzentos homens de infantaria e o
socorro que lhe mandaram os de Gaba. Enviei contra ele uma parte de meus
soldados e, como ele confiava na sua cavalaria, fiz o possível para atraí-los à
luta. Mas como eu tinha somente infantaria, não lhe quis dar essa vantagem.
Assim, depois de ter valentemente resistido, quando ele viu que a posição do
lugar não lhe era favorável, regressou a Gaba, tendo perdido somente três
soldados. Eu o persegui com três mil homens até uma aldeia da fronteira de
Ptolemaida, de nome Bezara, distante vinte estádios de Gaba. Fiz colocar
guardas nas avenidas para impedir o ataque dos inimigos e mandei carregar sobre
muitos camelos, que mandara vir para esse fim, o trigo que a rainha Berenice
tinha feito reunir naquele lugar, das aldeias dos arredores e o levei à
Galiléia. Depois mandei desafiar Ebúcio para um combate; ele não ousou
aceitá-lo, tanto nossa coragem o havia deixado atônito. Dali, sem perder tempo,
marchei contra Neapolitano, que, com a cavalaria que conservava na guarnição de
Citópolis, saqueava os arredores de Tiberíades. Consegui impedir que ele
continuasse suas correrias e entreguei-me todo ao governo da Galiléia.
João, filho de Levi, que estava, como dissemos, em Giscala,
vendo que todas as coisas sucediam-se felizmente, que eu era amado pelo povo e
temido pelos inimigos, considerou a minha boa sorte como um obstáculo à sua e,
ardendo de inveja, alimentava a esperança de me poder sobrepujar instigando
contra mim o ódio do povo. Para isso procurou agradar aos de Tiberíades e de
Séforis, a fim de atrair para seu partido as três principais cidades da
Galiléia; procurou também os de Gabara, fazendo crer que eles seriam muito mais
felizes sob seu governo do que sob o meu. Mas Séforis nada quis, nem com ele
nem comigo, porque pendia toda para os romanos; Tiberíades, que achava perigoso
revoltar-se, contentou-se em prometer-lhe viver em amizade com ele. Assim, os
de Gabara foram os únicos que abraçaram seu partido, ante a insistência de
Simão, que era seu amigo e um dos principais da cidade. Eles não ousaram, no
entanto, declarar-se abertamente, porque temiam os galileus, dos quais haviam
várias vezes constatado o afeto por mim, mas esperavam a ocasião de me
surpreender com uma traição; pouco faltou, então, para que deveras isso
acontecesse, pelo fato que passo a narrar:
Alguns jovens de Dabar, muito corajosos e ousados, tendo
sabido que a mulher de Ptolomeu, intendente dos negócios do rei, atravessava o Campo
Grande com magnífica equipagem e acompanhada de alguns cavaleiros para passar
das terras do rei à província dos romanos, atacaram sua escolta; tudo o que a
senhora pôde fazer foi salvar-se enquanto eles estavam ocupados com o saque.
Depois disso, vieram procurar-me, em Tariquéia, com quatro mulas carregadas de
muitas coisas de valor, baixelas de prata, e quinhentas peças de ouro. Como
Ptolomeu era judeu e nossas leis proíbem tomar as coisas dos da nossa própria
nação, mesmo quando fossem nossos inimigos, eu quis conservar essa presa para
resti-tuí-la; com esse fim, disse àqueles moços que devíamos guardá-lo, para
vendê-lo e mandar o produto a Jerusalém, a fim de empregá-lo na reparação dos
muros da cidade. Isso irritou-os de tal modo, porque esperavam aproveitar-se de
tudo, que fizeram correr o boato, nos arredores de Tiberíades, que eu queria
colocar a província sob o domínio dos romanos; que o que eu havia dito sobre
Jerusalém era falso, e minha verdadeira intenção era restituir tudo a Ptolomeu,
e nisso eles não restavam errados. Mal haviam eles me deixado, entreguei tudo o
que haviam apanhado a Dassiom e Jane, filhos de Levi, dois dos principais
habitantes de Tariquéia, muito queridos do rei. Dei-lhes ordem de que lho
entregassem e proibi-lhes, sob pena de morte, falar a quem quer que fosse.
No entanto, espalhou-se por toda a Galiléia o boato de que
eu a queria entregar aos romanos. Decidiram matar-me; os de Tariquéia, tendo
prestado fé a essa mentira, persuadiram os meus guardas e os soldados que me acompanhavam,
a aproveitar, quando eu estivesse dormindo, para encontrar com os outros no
Hi-pódromo,* a fim de deliberarem os meios de executar o seu intento. Foram
todos e lá encontraram um grande número de pessoas já reunidas. De comum acordo
deliberaram tratar-me como traidor da República e Jesus, filho de Safias, que
então era o principal juiz de Tiberíades e um dos piores homens do mundo, dos
mais sediciosos, para incitá-los ainda mais, mostrou-lhes as Leis de Moisés,
que tinha na mão e disse-lhes: "Se não estais comovidos ante a
consideração da vossa própria salvação, pelo menos não desprezeis estas santas
Leis, que o pérfido Josefo, vosso governador, não tem receio de violar, o qual
deveria ser castigado mui severamente por ter cometido tão grande crime".
Tendo assim falado e vendo que o povo aprovava com seus
gritos o que ele dizia, tomou consigo alguns soldados e veio ao meu aposento,
com o intuito de me matar. Como nada desconfiava e estava dormindo, cansado e
fatigado, Si-mão, um dos meus guardas, que tinha ficado comigo, vendo aquele
grupo furioso, despertou-me, avisou-me do perigo em que me encontrava e
exortou-me a morrer honrosamente, matando-me antes que ser morto pelos
inimigos. Eu me recomendei a Deus, tomei uma veste negra, para me disfarçar, e
levando somente minha espada,:passei pelo meio desse grupo e fui diretamente ao
hipódromo, por um outro jcamiinbo. Lá, prostrei-me diante de todos, banhei a
terra com minhas lágrimas, para comovê-los à piedade; quando vi que começavam a
se enternecer, procurei dividi-los em seus sentimentos, antes que aqueles que
me tinham ido matar estivessem de volta. Disse-lhes que não negava ter
conservado aqueles despojos, como me acusavam; mas rogava-lhes que me ouvissem,
para saber com que fim o fizera, e se achassem que eu havia errado, poderiam
depois mandar matar-me.
Então toda a multidão ordenou-me que falasse; os que tinham
ido procurar-me chegaram naquele mesmo instante e queriam lançar-se sobre mim
mas foram contidos pela voz unânime do povo. Julgaram que, depois de ter
confessado querer entregar aqueles despojos ao rei, eu passaria por traidor e
eles poderiam executar o seu intento, sem oposição alguma. Assim, toda a
assembléia calou-se para me escutar e eu falei: "Se julgais que eu mereço
a morte, não me recuso a sofrê-la; mas permiti-me antes declarar-vos toda a
verdade. Como eu havia reconhecido que a beleza e a comodidade de vossa cidade
atraem para ela os estrangeiros de todos os lugares e muitos dentre eles
abandonam seu país para vir habitar aqui; para dividir convosco os vossos dias
de felicidade e de adversidade, eu tinha intenção de empregar esse dinheiro lá
fazendo construir muralhas". A estas palavras, os habitantes e os
estrangeiros puseram-se a gritar que todos me eram muito agradecidos e que nada
mais eu tinha a temer.
Os galileus, ao contrário, e os de Tiberíades, continuavam
com sua animosidade. Estando assim divididos, uns me ameaçavam, outros me
tranqüilizavam. Depois que prometi aos de Tiberíades e aos das outras cidades,
cuja posição o permitisse, construir-lhes também muralhas, eles prestaram fé às
minhas palavras, a assembléia se dissolveu e me retirei com meus amigos e vinte
dos meus soldados, depois de, contra toda sorte de esperança, ter escapado de
tão grande perigo. Mas os autores da sedição, que julgavam que eu me vingaria,
reuniram-se armados em número de seiscentos e marcharam para minha casa, com a
intenção de incendiá-la. Avisaram-me disso em tempo, mas, julgando que me seria
vergonhoso fugir, recorri à audácia, à coragem, para me defender. Assim, depois
de ter mandado fechar as portas, subi ao andar mais alto do edifício, de onde
lhes gritei que mandassem alguns deles receber aquele dinheiro que era a causa
do seu descontentamento e de suas queixas. Mandaram logo o mais revoltoso de
todos; eu o fiz açoitar com varas, mandei cortar-lhe uma das mãos, que lhe
penduraram ao pescoço, e o despedi nesse estado. Este ato tão ousado fê-los
acreditar que eu tinha comigo um grande número de soldados e os assustou de tal
modo, que todos fugiram. Assim, pela minha firmeza e sagacidade evitei este
segundo perigo.
Alguns outros dos mais revoltosos continuavam ainda a
incitar o povo, dizendo que era preciso matar aqueles dois senhores que se
tinham refugiado junto de mim, pois recusavam-se submeter às leis de um país
onde tinham vindo procurar sua segurança e eram envenenadores, que favoreciam o
partido dos romanos. Quando vi que o povo se deixava enganar por essas
palavras, disse-lhe que era injusto perseguir pessoas que tinham vindo procurar
asilo entre nós; que aquele envenenamento de que lhes falavam era pura
imaginação e quimera, pois os romanos não tinham necessidade de manter um
número tão grande de legiões, se podiam, com esse meio, desfazer-se de seus
inimigos. Estas palavras acalmaram-no, mas os artifícios desses perturbadores,
irritaram-no de novo, e ele foi, armado, sitiar as casas dos dois senhores, com
o fim de matá-los. Eu fui avisado disso; temendo que, se cometessem tão grande
crime, ninguém mais desejasse vir para junto de nós, resolvi ir naquele mesmo
instante, acompanhado por alguns dos meus, à casa dos estrangeiros. Mandei
também fechar as portas da casa, saindo por um canal, até o lago que estava
perto, entrei com eles numa barca e os levei até a fronteira dos ipenianos. Ali
paguei-lhes o valor dos cavalos que eles não tinham podido trazer e,
dizendo-lhes adeus, exortei-os a suportar corajosamente a infelicidade que lhes
havia sucedido.
Na verdade, tinha o coração muito pesaroso, por ser obrigado
a expor ainda uma vez, num país inimigo, pessoas que tinham vindo buscar
segurança entre nós. Julguei, no entanto, que era preferível pô-los em perigo
de morrer nas mãos dos romanos do que vê-los assassinados diante de meus olhos,
numa província que eu governava. Eles, porém, evitaram a desgraça que eu lhes
imaginava, porque o rei Agripa acalmou-se e perdoou-os.
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* Lugar onde se realizavam as corridas de cavalos.
Nesse mesmo tempo, os habitantes de Tiberíades escreveram ao
soberano e prometeram-lhe entregar-se a ele, se lhes prometesse mandar tropas
para a defesa de seu país. Logo que soube disso, fui procurá-los; como eles
sabiam que Tariquéia já tinha sido rodeada de muralhas, rogaram-me que
cumprisse a palavra que lhes havia dado, de lhes fazer o mesmo favor. Eu o fiz
e mandei buscar o material e os operários. Parti três dias depois de Tiberíades
para Tariquéia, que dista dali trinta estádios. Logo que saí, alguns cavaleiros
apareceram perto da cidade e os habitantes julgaram que eram tropas do rei;
começaram a me injuriar com toda espécie de impropérios. Um homem veio com toda
a pressa avisar-me do que se passava e acrescentou que tudo fazia prever uma
revolução. Essa notícia encheu-me de espanto, tanto mais que havia dispensado
de Tariquéia todos os meus soldados, porque o dia de sábado estava perto e
desejava que os habitantes pudessem celebrá-lo sem serem perturbados pelos
soldados; eu fazia sempre assim, naquela cidade, pela confiança que tinha no
afeto dos habitantes o qual havia tantas vezesexperimentado. Assim, tendo
comigo apenas sete soldados e alguns amigos, não sábia o que fazer. De um lado,
não via probabilidade de reunir minhas tropas na véspera de um dia errxque
nossas leis não nos permitem combater, mesmo nas ocasiões mais prementes; por
outro lado, não me achavam bastante forte, quando mesmo tivesse podido, nessa
ocorrência, servir-me dos habitantes de Tariquéia e dos estrangeiros que lá
habitavam, rogando-Ihes que me ajudassem na esperança de ricos despojos.
No entanto, esse assunto não padecia demora, pois, por pouco
que o adiasse, aqueles que, se dizia, o rei havia enviado, tornar-se-iam
senhores da cidade e me impediriam de lá entrar. Na ansiedade em que me
encontrava, dei ordem a alguns amigos meus, nos quais confiava, que montassem
guarda às portas da cidade e não deixassem ninguém sair. Mandei depois aos
principais habitantes que subissem cada qual a um barco com um barqueiro
somente para seguir-me até Tiberíades; eu também subi a um deles, com sete
soldados e alguns amigos. Os de Tiberíades, que não sabiam que eu tinha sido
avisado do que se passava, vendo que não haviam chegado tropas do rei e que
todo o lago estava coberto de barcos, que eles julgavam cheio de soldados,
ficaram tomados de tão grande temor que imediatamente mudaram de opinião; deixaram
as armas e vieram à minha presença, com suas mulheres e filhos, e desejando-me
toda sorte de prosperidade, rogavam-me que continuasse a lhes demonstrar o meu
afeto. Ordenei aos que dirigiam os barcos que me seguiam, que se detivessem
longe da terra, para que eles não pudessem perceber as poucas pessoas que
estavam dentro deles; aproximei-me da margem e dirigi severas recriminações aos
da cidade, por terem violado tão levianamente a palavra que me haviam dado.
Prometi-lhes, no entanto, perdoá-los, contanto que me enviassem dez dos
principais dentre eles, o que fizeram imediatamente. Pedi ainda mais outros
dez; e continuei a usar do mesmo ardil, até que consegui enviar a Tariquéia
todo o Senado de Tiberíades e um grande número de seus principais habitantes.
Então o povo, vendo o perigo em que se achava, rogou-me que
castigasse o autor da sedição. Era um jovem de nome Clito, muito corajoso e
muito atrevido. Fiquei muito embaraçado; pois, de um lado, não podia tomar a
decisão de mandar matar um homem da minha nação e, por outro lado, era assaz
importante dar um castigo exemplar. Nessa dificuldade, tomei logo uma das
resoluções, isto é, ordenei a Levi, um dos meus guardas, que o prendesse e lhe
cortasse uma das mãos. Como visse que ele não ousava prendê-lo, no meio de tão
grande multidão, não querendo que os de Tiberíades percebessem sua timidez,
chamei Clito e disse-lhe: "Ingrato! Pérfido! Merecestes que lhe
cortássemos ambas as mãos; sereis vós mesmo vosso algoz, se não quereis ser
castigado ainda com maior severidade". Ele então rogou-me que lhe
conservasse pelo menos uma das mãos. Eu concedi-lho, mas fingindo resolver-me a
isso, contra a vontade; no mesmo instante ele cortou a mão esquerda com a
própria espada. Assim
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
Não perca tempo, Indique esta maravilhosa
Leitura
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