História De Israel – Teologia 31.214
CAPÍTULO 13
HERODES MANDA CONSTRUIR UMA SOBERBA CIDADE EM HONRA DE
AUGUSTO, À QUAL DÁ O NOME DE CESARÉIA. ENVIA A AUGUSTO OS
SEUS
DOIS FILHOS, ALEXANDRE E ARISTÓBULO, QUE TIVERA DE MARIANA.
AUGUSTO
CONCEDE-LHE AINDA NOVOS FAVORES. CAUSA DO BOM TRATAMENTO QUE
HERODES DISPENSAVA AOS ESSÊNIOS.
669. Herodes, tendo notado ao longo do mar a torre de
Estratão, cuja situação era muito vantajosa, edificou ali uma cidade de forma e
beleza admiráveis. Não somente os palácios eram magníficos, construídos de
mármore branco, como também apresentavam belíssima arquitetura as casas dos
particulares. E o porto, com dimensões semelhantes às do Pireu, onde os navios
podiam ancorar em segurança, sobrepujava a tudo o mais. A estrutura era
maravilhosa. Havia dentro grandes magazines para receber toda sorte de
mercadoria e de objetos. Foi necessário, para levar a cabo tão grande obra, um
trabalho extraordinário e uma despesa fabulosa, porque era preciso trazer de
muito longe todo o material.
Essa cidade está na Fenícia, situada no lugar onde se
embarca para passar ao Egito, entre Jope e Adora, que são duas pequenas cidades
marítimas. Os portos destas, porém, não são seguros, porque são batidos pelo
vento áfrico, cuja impe-tuosidade levanta tão grande quantidade de areia contra
a praia que os navios carregados de mercadorias aí não podem estar seguros, e
os pilotos são obrigados a lançar as âncoras ao mar. Para remediar esse
inconveniente, Herodes mandou construir o porto de Cesaréia em forma de
crescente, capaz de conter um grande número de navios. E, como o mar mede ali
vinte braças de profundidade, mandou lançar pedras de tamanho enorme, a maior
das quais tinha cinqüenta pés de comprimento, dezoito de largura e nove de
altura. E havia ainda maiores.
A extensão do cais era de duzentos pés, cuja metade servia
para quebrar a violência nas ondas, e construiu-se na outra metade um muro
fortificado com torres, sendo que a maior e mais bela recebeu de Herodes o nome
de Druso, filho da imperatriz Júlia,* mulher de Augusto, que morreu jovem.
Havia ainda diversos arcos em forma de pórticos, para alojar os marinheiros.
Uma descida muito suave e que poderia servir de belíssimo passeio rodeava todo
o porto, cuja entrada estava exposta ao aquilão, que é o mais forte de todos os
ventos. Havia do lado esquerdo, por onde se entrava no porto, uma torre
construída sobre uma plataforma muito larga, feita para resistir à violência
das vagas.
Do lado direito, estavam duas colunas de pedra, tão grandes
que superavam a altura da torre. Via-se ao redor do porto uma fileira de casas
cujas pedras eram muito bem talhadas, e construiu-se sobre uma colina que está
meio o Templo consagrado a Augusto. Os que navegam podem vê-lo de bem longe, e
há duas estátuas, uma de Roma e outra desse príncipe, em honra do qual Herodes
deu o nome de Cesaréia a essa cidade, não menos admirável pela riqueza de suas
construções que pela magnificência de seus ornamentos.
Fizeram-se em terra longos arcos, distantes igualmente uns
dos outros, que se dirigiam todos para o mar, e havia um que os atravessava
para levar até ele a água da chuva e as imundícies da cidade e receber ao mesmo
tempo as águas do mar, quando este se achasse muito agitado, a fim de lavar
assim a maior parte das ruas. Herodes mandou também construir um circo de pedra
e, ao lado do porto que está voltado para o sul, um enorme anfiteatro, de onde
se pode ver bem ao longe por sobre o mar. E, como ele não economizava nem
trabalho nem dinheiro em tão grandes obras, empregou doze anos para fazê-la
chegar à sua maior perfeição.
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* Josefo chama-a Júlia, mas na verdade é a princesa Lívia.
670. Depois que
construiu essas duas grandes cidades, Sebaste e Cesaréia, o magnífico monarca
enviou a Roma Alexandre e Aristóbulo, filhos que tivera de Mariana, para que se
fixassem na corte de Augusto. Poliom, que era seu íntimo amigo, preparou-lhes
um belo alojamento, mas sem necessidade, porque Augusto quis hospedá-los no
palácio real. Esse grande imperador recebeu-os com singular gentileza e demonstrações
de afeto, deixando ao pai deles a liberdade de tomar por sucessor aquele que
quisesse escolher para tal. Aumentou ainda o reino de Herodes em três
províncias: Traconites, Batanéia e Auranite, pelo fato que vou narrar.
671. Zenodoro, que se
havia apoderado dos bens de Lisânias, não se contentando com os rendimentos que
deles podia tirar legitimamente, tentou aumentá-los, favorecendo os roubos
pelos de Traconites, que costumavam assaltar os arredores de Damasco. Assim, em
vez de se opor a eles, Zenodoro tinha parte no produto do roubo. Foram então
queixar-se a Varo, governador da província, e ele escreveu a Augusto, que lhe
ordenou destruir completamente os redutos desses salteadores e que desse o país
a Herodes, a fim de que ele impedisse, com os seus cuidados, a continuação de
tal desordem.
Seria muito difícil remediá-la, pois os que viviam desses
roubos não iam nem para as cidades nem para as aldeias, mas para as cavernas,
onde viviam como animais. Fazendo provisões de víveres e de água, lá se escondiam
quando eram atacados ou perseguidos. A entrada dessas cavernas é tão estreita
que só é possível entrar uma pessoa por vez, porém no interior são muito
espaçosas, mais do que se pode imaginar. A terra que as cobre é plana, mas tão
pedregosa e áspera que dificilmente sexonsegue andar ali. Não se pode percorrer
sem um guia as estradas que levam a essas cavernas, tão tortuosas e emaranhadas
elas são. Aqueles homens eram ainda tão maus que quando não podiam roubar mais
ninguém, roubavam uns aos outros.
Logo que Herodes se tornou senhor dessas terras, pela doação
de Augusto, ele conseguiu, valendo-se de bons guias, chegar até as cavernas e
reprimir todos os assaltos, restituindo a calma a todos os países das
redondezas. Zenodoro, abatido de dor pela perda de seus bens e pelo ódio contra
Herodes, que os havia tirado, foi a Roma para queixar-se, mas inutilmente.
672. Por esse mesmo
tempo, Augusto enviou Agripa, a quem ele tinha uma estima muito particular,
para governar a Ásia. Herodes foi procurá-lo em Mitilene e voltou depois a
Jerusalém. Os habitantes de Cadara, querendo fazer queixas dele a Agripa,
dirigiram-se para lá. Agripa, no entanto, não somente não os escutou como ainda
os despediu acorrentados.
673. Então os árabes,
que não toleravam o domínio de Herodes, procuravam havia muito oportunidade
para se revoltar e julgaram ter encontrado uma ocasião favorável. Zenodoro, de
quem acabamos de falar, vendo malparados os seus negócios, vendeu Auranite, que
fazia parte do que ele antes possuía, por cinqüenta talentos. E, como estava
compreendida na doação feita por Augusto a Herodes, os árabes julgaram que lhes
estavam fazendo uma enorme injustiça e não iriam tolerá-la. Assim, esforçam-se
de todos os modos para conservar a província, tanto afirmando o seu direito
perante os juizes quanto pela força, servindo-se de alguns soldados que se
compraziam em tomar parte em agitações. Herodes, para evitar que sucedesse
alguma rebelião, julgou conveniente remediar esse mal mais pela conciliação que
pela violência.
No décimo sétimo ano de seu reinado, Augusto veio à Síria e
ouviu ali muitas queixas contra Herodes, da parte dos habitantes de Gadara, que
o acusavam de tirania. Zenodoro, principalmente, os levava a isso,
prometendo-lhes com juramento jamais descansar até libertá-los da dominação de
Herodes e trazê-los de volta à de Augusto. Mas o que os tornou ainda mais
atrevidos em se rebelar contra Herodes foi o fato de este não castigar os que
Agripa lhe mandara acorrentados, pois quanto ele era severo com os seus súditos
tanto era afável com os estrangeiros. E atreveram-se ainda a acusá-lo de haver
feito exações. Herodes, sem se comover, preparava-se para se justificar, mas
Augusto o recebeu muito bem e demonstrou que de nenhum modo se deixara
impressionar para aquelas queixas. Disse-lhe somente alguma coisa no primeiro
dia e depois não tocou mais no assunto.
Quando os habitantes viram que os sentimentos de Augusto e
dos de sua maior confiança eram favoráveis a Herodes, o temor de serem
abandonados à vontade dele levou alguns a cometer suicídio na noite seguinte,
outros a se precipitar nos abismos e outros ainda a se afogar. Assim, tendo
eles mesmos se condenado, Augusto não encontrou dificuldade em absolver
Herodes. Aconteceu também a esse rei dos judeus outro fato auspicioso: Zenodoro
morreu em Antioquia, por causa de uma disenteria, e Augusto deu-lhe então todos
os outros bens que ele possuía na Galiléia e Traconites, que era muito extensa,
porque compreendia Ulata, Paneada e as terras vizinhas. Augusto acrescentou-lhe
ainda outro favor: ordenou aos governadores da Síria que nada fizessem sem
ordem do rei da Judéia.
Augusto reinava sobre quase toda a terra, e podia-se dizer
que Agripa governava depois dele esse poderoso império. Nisso era grande a
felicidade de Herodes, pois Augusto, depois de Agripa, não estimava ninguém
como a ele, e Agripa não estimava ninguém mais que a Herodes, depois de
Augusto. Dois apoios tão poderosos davam-lhe motivo de esperar todo poder,
então ele pediu e obteve de Augusto para Feroras, seu irmão, a vice-govemança
de todo o seu reino e recolheu imediatamente cem talentos de sua renda a fim de
que o irmão tivesse com que viver depois de sua morte, sem depender dos filhos.
Depois acompanhou Augusto até o embarque e construiu em sua honra, nas terras de
Zenodoro, perto de Panio, um soberbo Templo de mármore branco. Panio é uma
enorme caverna sob um monte muito agradável, onde nascem as águas do Jordão.
Como esse lugar era já muito célebre, Herodes escolheu para lá consagrar esse
Templo a Augusto.
674. Nesse mesmo tempo, Herodes dispensou os seus súditos da
terça parte dos tributos, dizendo que o fazia para que se refizessem dos males
causados pela carestia. Mas a verdadeira razão era que ele queria acalmar-lhes
o espírito por aquelas grandes obras, tão contrárias à sua religião e pelas
quais eles não dissimulavam o seu descontentamento. Temendo as conseqüências
dessa indisposição, tudo ele fez para diminuí-la e mesmo impedi-la. Ordenou que
cada qual se ocupasse apenas de seus assuntos particulares e proibiu, sob
grandes castigos, as assembléias e os banquetes em Jerusalém. Prezava tanto a
observância desse edito que havia guardas nas cidades e nos grandes caminhos
para vigiar e prender os que desobedecessem, os quais eram secreta ou mesmo
abertamente levados à fortaleza de Hrrcânia e ali castigados com rigor. Diz-se
que ele próprio se disfarçava-eom freqüência e à noite misturava-se com o povo
para auscultar-lhe os sentimentos com relação ao governo. E castigava sem
misericórdia os que condenavam o seu proceder, obrigando os outros com
juramento a jamais lhe faltar à fidelidade.
Assim, a maior parte fazia por medo tudo o que ele ordenava,
e não havia meios de que ele não se servisse para condenar os que, não
suportando aquele tratamento, tinham a coragem de se queixar. Quis também
obrigar Poliom Fariseu, Sameas e a maior parte de seus discípulos ao mesmo
juramento. Porém, ainda que eles recusassem fazê-lo, não os castigou como aos
demais, pelo respeito que tinha a Poliom, e dispensou também do juramento os que
nós chamamos essênios, cujos sentimentos são semelhantes aos dos filósofos e
aos quais os gregos chamam pitagóricos, como já dissemos alhures. Sobre isso,
creio não me afastar do assunto de minha história se disser a razão que levou
Herodes a ter deles uma opinião tão favorável.
675. Um essênio, de nome Manaém, que levava uma vida muito
virtuosa e era louvado por todos, recebeu de Deus o dom de predizer o futuro.
Tendo ele visto Herodes ainda bastante jovem estudar com as crianças de sua
idade, disse-lhe que ele reinaria sobre os judeus. Herodes julgou que ele não o
conhecia ou que estava zombando dele e por isso respondeu-lhe que bem via que
ele desconhecia a sua origem e o seu nascimento, que não eram tão ilustres que
o fizessem esperar tal honra.
Manaém retrucou, sorrindo e dando-lhe uma palmadinha nas
costas: "Eu vo-lo disse e vo-lo digo ainda que sereis rei e reinareis
venturosamente, porque Deus assim o quer. Lembrai-vos então desta pancadinha
que vos acabo de dar, para indicar as diversas mudanças de sorte, e nunca vos
esqueçais de que um rei deve ter continuamente diante dos olhos a piedade que
Deus lhe pede, a justiça que deve ministrar a todos e o amor que é obrigado a
ter pelos seus súditos. Mas sei que não o fareis quando fordes elevado a tão alto
grau de poder. Pois sereis feliz em tudo o mais e digno de glória imortal tanto
quanto sereis infeliz por vossa impiedade para com Deus e vossa injustiça para
com os homens. Mas não podereis escapar à vista desse Senhor soberano do
universo. Ele penetrará os vossos pensamentos mais ocultos, e experimentareis
no fim de vossa vida os efeitos de sua cólera".
Herodes não deu então grande importância a essas palavras,
mas quando se viu elevado ao trono e em tão grande prosperidade, mandou buscar
Manaém e perguntou-lhe sobre a duração de seu reinado, se chegaria a dez anos.
Ele respondeu: "De vinte a trinta", sem nada determinar de positivo.
Herodes, muito satisfeito com essa resposta, despediu-o corwnuita gentileza e
depois disso tratou sempre os essênios muito favoravelmente. Não duvido de que
isso, para muitos, pareça inacreditável. No entanto, julguei dever relatá-lo,
porque há vários dessa seita aos quais Deus se digna revelar os seus segredos,
por causa da santidade de sua vida.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
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Leitura
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