História De Israel – Teologia 31.262
CAPÍTULO 3
O REI AGRIPA FORTALECE CLÁUDIO NA RESOLUÇÃO DE ACEITAR O
GOVERNO. OS SOLDADOS QUE TINHAM ABRAÇADO O PARTIDO DO SENADO, ABANDONAM-NO E SE
UNEM AOS QUE PRESTARAM JURAMENTO A CLÁUDIO, NÃO OBSTANTE OS ESFORÇOS DE CHEREAS
PARA IMPEDI-LOS. CLÁUDIO TORNA-SE IMPERADOR E CONDENA CHEREAS À MORTE. ELE A
SOFRE COM MARAVILHOSA FIRMEZA. SABINO, UM DOS PRINCIPAIS CONJURADOS,
SUICIDA-SE.
807. Cláudio, ciente de que o senado estava convencido de
poder reconquistar a sua primitiva autoridade, respondeu com muita modéstia,
para não chocar os sentimentos deles. Porém não demorou muito a superar os seus
temores, em parte pela proteção que lhe prometiam os soldados e em parte pelo
fato de Agripa já o haver exortado a não ser inimigo de si mesmo, recusando o
oferecimento de um poder que lhe permitiria governar a maior parte da terra.
Por fim, decidiu-se a tudo fazer, no que dependia dele, para secundar a sua boa
estrela.
Esse rei dos judeus, que devia a Caio a sua coroa, havia
colocado o corpo do imperador sobre um leito, com toda a cortesia que o tempo
lhe permitiu, dizendo aos guardas que ele não estava morto, que as feridas o
faziam sofrer muitas dores e que ele tinha necessidade urgente de médicos. E,
quando soube que os soldados haviam levado Cláudio, rompeu a multidão para ir
ter com ele, encontran-do-o em tal aflição de espírito que parecia prestes a
ceder a autoridade ao senado. Então Agripa restituiu-lhe a coragem e o animou a
não perder aquela ocasião de subir ao trono do império.
Mal havia ele inspirado em Cláudio tais sentimentos e
voltado para casa, vieram dizer-lhe que o senado o estava convidando a tomar
assento na companhia deles. Agripa perfumou a cabeça, para fazer pensar que
saíra da mesa, e, fingindo nada saber do que se passava, perguntou, ao chegar,
o que havia acontecido com Cláudio. Contaram-lhe então tudo o que havia
sucedido e rogaram que ele manifestasse a sua opinião sobre o presente estado
das coisas. Ele declarou que estava pronto a dar a vida para manter a dignidade
do senado, mas julgava que eles deviam antes considerar o que lhes seria mais
útil e agradável. Pois, se estavam resolvidos a retomar a soberana autoridade,
precisariam de armas e de soldados, para não sucumbir em tão ingente
empreendimento. Eles responderam que o senado possuía homens e armas, bem como
dinheiro para fazer a guerra, e que poderiam ainda armar uma grande quantidade
de escravos, aos quais dariam a liberdade.
Agripa replicou: "É meu desejo, senhores, que o vosso
intento se realize, tal como o desejais. Mas o cuidado que tenho pela vossa
preservação me obriga a dizer-vos que vejo uma extrema diferença entre o grande
número de soldados experientes que abraçaram o partido de Cláudio e os escravos
de que falais, porque estes são homens desacostumados à disciplina e que mal
sabem manejar uma espada. Por isso, sou de opinião que entreis em contato com
Cláudio a fim de dissuadi-lo de sua pretensão ao império. E ofereço-me para ir
com os vossos delegados". A proposta foi aprovada, e o príncipe partiu,
acompanhado por alguns senadores. E, depois de uma conversa em particular com
Cláudio a respeito da agitação que reinava no senado, aconselhou-o a falar como
um príncipe que já se julga no trono.
Cláudio respondeu aos delegados que não se admirava de ver
que o senado estava ressentido da monarquia, depois de haverem sido tão
maltratados sob a tirania dos imperadores precedentes, mas que sob o seu
governo eles experimentariam uma dominação moderada que de império teria apenas
o nome, e todas as coisas se orientariam conforme o parecer deles e a aprovação
de todos. A esse respeito não podiam duvidar de sua palavra, pois eles mesmos
eram testemunhas da maneira como ele vivera até ali, sem jamais incorrer num
ato que lhes desse motivo para censura. Após despedir os emissários, discursou
perante os soldados que se haviam unido a ele e obteve deles juramento de
fidelidade. Depois distribuiu a cada um cinco mil dracmas e gratificou os
oficiais na proporção do número de homens que comandavam, prometendo tratar
favoravelmente todas as outras tropas, onde quer que estivessem.
808. No dia seguinte, pela manhã, antes do despontar do dia,
os cônsules reuniram o senado no Templo de Júpiter, no Capitólio. Alguns
senadores, porém, não se atreveram a sair de casa, e outros partiram para as
suas casas de campo, porque, vendo o rumo que as coisas estavam tomando,
preferiam uma servidão tranqüila a uma empresa tão perigosa como a de
reconquistar a liberdade. Apenas uns cem deles compareceram à reunião.
Enquanto deliberavam, ouviu-se à porta um grande rumor de
soldados, os quais pediam que o senado escolhesse um imperador, aquele que
dentre eles fosse o mais digno, a fim de impedir o prejuízo que o império
sofreria, caso fosse repartido entre vários governantes. Esse pedido, tão
contrário à esperança que o senado tivera de reconquistar a liberdade e o
antigo poder, perturbou-os ainda mais, pois já estavam pressionados pelo temor
de que Cláudio assumisse o trono. Havia no entanto alguns que, pela nobreza de
seu nascimento ou por alianças matrimoniais com os césares, se achavam no
direito de ansiar o supremo poder.
Marcos Minúcio, um dos mais ilustres romanos, que desposara
júlia, irmã de Caio, ofereceu-se para governar o império. Os cônsules, em vez
de lhe responder, passaram a outros assuntos. Valério Asiático tinha o mesmo
desejo que Minúcio, mas Minuciano. aue fizera parte da conspiração contra Caio,
impediu que ele se declarasse. Isso porque se alguém chegasse a disputar
abertamente o império a Cláudio haveria uma das mais terríveis carnificinas de
que jamais se ouviu falar, pois, além de um grande número de gladiadores e das
companhias de sentinela mantidas para fazer a ronda na cidade durante a noite,
um grande número de remadores unir-se-ia também a eles. Essa extrema desordem,
tão fácil de se prever, afastou vários senadores da pretensão ao império, fosse
pelo temor do perigo em que Roma se encontrava, fosse pelo risco que eles
mesmos correriam.
809. O dia apenas
começava a raiar quando Chereas apareceu com os seus amigos e sinalizou aos
soldados que lhes desejava falar. Em vez de atendê-lo, no entanto, eles
puseram-se a gritar, exigindo que eles sem demora lhes dessem um imperador.
Desse modo, o senado compreendeu o desprezo que aqueles soldados tinham pela
autoridade deles, e isso anulava toda a possibilidade de se restaurar a antiga
forma de governo. A falta de respeito dos soldados por aquela assembléia tão
augusta também despertou a ira de Chereas e dos que o haviam ajudado na
conspiração contra Caio. Não tolerando mais que continuassem a insistir num
imperador, disse-lhes, encolerizado, que lhes daria um, contanto que lhe
trouxessem uma ordem de Êutico.
Êutico era um cocheiro a quem Caio muito havia estimado e de
que se servia para os mais baixos serviços e o mais vis misteres. Acrescentou a
isso diversas censuras, ameaçando mesmo trazer-lhes a cabeça de Cláudio e
declarando que era coisa vergonhosa eles desejarem entregar o império a um
tolo, após ele ter sido arrancado das mãos de um louco. Os soldados, porém,
arrancaram das espadas sem se dignar escutá-lo e foram, com as suas bandeiras,
procurar Cláudio a fim de se unirem aos demais que já lhe haviam prestado
juramento.
810. O senado,
vendo-se abandonado por aqueles que o deviam defender e sabendo que os cônsules
não tinham qualquer autoridade, ficou bastante indeciso. O fato de haverem
irritado Cláudio aumentou-lhe tanto o temor que o arrependimento por tal
excesso os levou a mútuas censuras. No meio dessa balbúr-dia, Sabino, um dos
que haviam matado Caio, adiantou-se e afirmou que os mataria todos, para não terem
de suportar que Cláudio subisse ao trono e se iniciasse uma nova escravidão.
Disse a Chereas, com grande ardor, que era estranho que ele, tendo sido o
primeiro a atacar o tirano, agora se permitisse continuar a viver sem que a sua
pátria houvesse reconquistado a liberdade. Chereas retrucou que não tinha amor
à vida, mas queria antes saber quais eram os sentimentos de Cláudio.
811. Enquanto isso,
os soldados se dirigiam de todas as partes ao acampamento para se unir a
Cláudio. Quinto Pompeu, um dos cônsules, foi também com eles. Mas como era
odioso aos soldados, porque havia exortado o senado a manter a liberdade,
vieram a ele de espada na mão e o teriam matado se Cláudio não os impedisse.
Após livrá-lo daquele perigo, convidou-o a sentar-se junto dele. Não houve a
mesma consideração para com os senadores que o acompanhavam, pois eles foram
proibidos de se aproximar de Cláudio para saudá-lo. Alguns chegaram a ser
feridos, entre eles Apônio, e não houve um só que não tivesse corrido grave
perigo de vida. O rei Agripa, entretanto, aconselhou Cláudio a tratar com
gentileza aquelas pessoas, que eram as principais do império, porque do
contrário não haveria mais ninguém da nobreza com quem ele pudesse governar.
Ele aprovou essa advertência e pediu imediatamente ao senado que se reunisse em
seu palácio, para onde ele se fez levar em liteira através da cidade,
acompanhado pelos soldados, que afastavam o povo.
812. Por esse mesmo
tempo, Chereas e Sabino, que haviam sido os mais influentes na conspiração, não
tiveram receio de se apresentar em público, contra a ordem de Poliom, a quem
Cláudio pouco antes nomeara capitão da guarda pretoriana. Mas Cláudio, logo que
chegou ao palácio, reuniu os seus amigos e condenou Chereas à morte. Eles não
podiam, no entanto, deixar de reconhecer que a ação que ele havia praticado
fora gloriosa, porém o acusaram de traição e acharam que a sua morte traria
segurança ao imperador. Levaram-no então ao suplício, com Lupo e vários outros
conjurados.
Conta-se que ele demonstrou maravilhosa firmeza e que, além
de não alterar o rosto, censurou a fraqueza de Lupo, ao vê-lo chorar porque lhe
haviam tirado a túnica: disse-lhe que um lobo* jamais sentia frio. No meio da
grande multidão que o rodeava, ele perguntou ao soldado que o iria executar se
ele estava bem treinado naquele ofício e se a sua espada estava bem afiada.
Pediu depois que lhe trouxessem a espada com a qual havia matado Caio. Um único
golpe decepou-lhe a cabeça. Lupo, no entanto, recebeu vários golpes, porque o
medo fazia com que a balançasse. Alguns dias depois, celebrou-se a festa na
qual os romanos fazem ofertas pelos parentes mortos, e o povo as lançou ao fogo
em honra a Chereas, pedindo que ele lhes perdoasse a ingratidão. Dessa forma,
chegou ao fim aquele que deixou célebre a sua memória por um em-preendimento
tão generosamente concebido, mantido com tanta perseverança e tão corajosamente
executado.
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* Lupo significa lobo, em latim. (N. do R.)
813. Quanto a Sabino, Cláudio não se contentou em perdoá-lo,
mas o conservou no cargo, dizendo que não podia faltar à palavra dada aos que o
haviam envolvido na conjuração. Mas esse generoso romano, incapaz de
resignar-se a sobreviver à supressão da liberdade pública, matou-se com um
golpe de espada, libertando-se de uma vida que a sua coragem tornaria
insuportável.
Que o Santo Espirito do Senhor, ilumine
o nosso entendimento
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